Juiz afasta peculato por uso, como viatura, de carro apreendido: “fumaça sem fogo”
Por Eduardo Velozo Fuccia
O crime de peculato exige a ocorrência de efetivo dano ao patrimônio público, além de elemento subjetivo do tipo consistente no proveito próprio ou alheio visado pelo agente. Sem tais circunstâncias elementares, não há o delito, sendo obrigatória a absolvição.
Com essa fundamentação, o juiz Vinicius de Toledo Piza Peluso, da 1ª Vara Criminal de Praia Grande, absolveu sumariamente um policial civil acusado de utilizar o Fiat Siena apreendido com um suposto traficante, como se viatura fosse o veículo.
Em sua decisão, Peluso citou o magistério de Nelson Hungria. “Peculato consumado sem dano efetivo é tão absurdo quanto dizer-se que pode haver fumaça sem fogo, ou sombra sem corpo que a projete, ou telhado sem paredes ou esteios de sustentação”.
Segundo denúncia do Ministério Público (MP), com a utilização do automóvel apreendido em procedimento policial, sem o preenchimento do procedimento usual, qual seja, o depósito judicial, o policial civil cometeu o crime de peculato.
O uso indevido do carro, conforme a acusação formal do MP, ocorreu entre os dias 18 de dezembro de 2013 e 30 de março de 2015. Na hipótese de condenação, o agente público estaria sujeito a pena de dois a 12 anos de reclusão.
Porém, o magistrado observou que o MP foi omisso no ônus de descrever na denúncia o eventual dano causado pelo réu, bem como a sua intenção de favorecer a si próprio ou a outrem com a sua conduta, impedindo inclusive a ampla defesa do réu.
Desse modo, após a defesa do réu responder à acusação, Peluso considerou a denúncia inepta (sem atender às exigências legais) e absolveu sumariamente o policial, por não se constituir crime o fato narrado. Para o juiz, houve mero ilícito administrativo ou civil.
Defensores do agente público, os advogados Armando de Mattos Júnior e Gabriel Dondon Salum Sant’Anna destacaram que a conduta do cliente, além de não causar prejuízo ao patrimônio público, beneficiou a Administração e a sociedade.
“O Siena foi apreendido com um traficante e era utilizado em diligências como viatura descaracterizada. O Estado e a sociedade se beneficiaram com o seu uso. O policial apenas cumpriu as diligências, sob ordens superiores”, argumentou Armando de Mattos.