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03/08/2018

Justiça Militar denuncia oito por fraudes na emissão de documentos na Marinha

Por Eduardo Velozo Fuccia

O pagamento de propinas para agilizar a emissão de títulos de inscrição de embarcação (TIEs), sem a observância das regras exigidas pela Marinha, configura crimes militares tanto para os particulares que as pagam como para os agentes públicos que as recebem.

Por esse motivo, o promotor de Justiça Militar Adilson José Gutierrez denunciou um suboficial e um primeiro-sargento da Marinha pelo crime de corrupção passiva, além de seis despachantes navais pelo delito corrupção ativa. A ação penal foi distribuída à 1ª Auditoria da 2ª Circunscrição Judiciária Militar.

Previstos no Código Penal Militar (CPM), os crimes são puníveis com reclusão de até dez anos e oito meses. A ação penal foi oferecida em 31 de outubro de 2017, embora os delitos tenham ocorrido entre 1º de janeiro e 31 de julho de 2013.

Neste período, conforme ficou apurado em Inquérito Policial Militar (IPM), que serviu de base à denúncia do Ministério Público Militar (MPM), 620 embarcações foram beneficiadas pelo esquema criminoso.

Naquela ocasião, o suboficial e o sargento serviam na Capitania dos Portos de São Paulo (CPSP) e eram os responsáveis pela emissão dos TIEs e pelo registro dos barcos e dos seus donos no Sistema de Gerenciamento de Embarcações da Marinha (Sisgemb).

Segundo o promotor, os 620 TIEs foram emitidos mediante a utilização de senha e login pessoal do sargento. Em todos os casos, o banco de dados do Sisgemb foi alimentado fora da Seção de Cadastro de Embarcações da CPSP, conforme atesta laudo pericial.

Inicialmente, um homem detectou dois motores de barcos adquiridos por ele registrados em nome de um terceiro, que sequer conhece. Alertada sobre o ocorrido e na tentativa de apurar o que imaginava ser um erro, a CPSP descobriu que se tratava de fraude.

Na época, o capitão de mar e guerra Marcelo Ribeiro de Souza, comandante da Capitania dos Portos, determinou uma auditoria para verificar a real extensão do problema. De um total de 902 operações, 620 foram realizadas irregularmente, com a emissão de TIEs sem a apresentação dos documentos necessários.

O capitão de mar e guerra Ricardo Fernandes Gomes sucedeu Ribeiro de Souza no comando da CPSP e determinou o bloqueio das 620 embarcações com os títulos de inscrição falsos, durante o IPM aberto para investigar o caso.

“Os dois denunciados (suboficial e sargento), em comunhão de desígnios, articularam um esquema criminoso para emitir rapidamente essa enorme quantidade de TIEs sem a necessidade de obediência a regras técnicas exigidas pela Marinha, tudo em troca de dinheiro dos proprietários e/ou de despachantes navais interessados”, descreveu o promotor Gutierrez em sua denúncia.

Os militares tiveram o sigilo bancário quebrado judicialmente. “Intensas transferências de dinheiro” foram constatadas entre as contas de uma despachante e o suboficial, frisou o promotor, para quem tais transações demonstram que este militar “fazia da mercancia de sua função pública um meio criminoso de vida”. Outro despachante admitiu realizar pagamentos ao suboficial em espécie e em cheques de terceiros.

Maior rigor

Com a descoberta do esquema, “foram realizadas mudanças significativas no procedimento para a emissão de documentação, visando obstar (dificultar) a repetição da prática fraudulenta, evitando, assim, transtornos para toda a sociedade”, afirma a Marinha do Brasil em nota.

A principal mudança foi a criação do Grupo de Atendimento ao Público (GAP), segregando as funções de recebimento dos documentos e de lançamento dos dados no Sisgemb. Desse modo, evita-se o contato das pessoas que operam o sistema com as partes interessadas.

No comunicado, a instituição “lamenta o ocorrido, reafirma a sua postura de zelar pela integridade na conduta de seu pessoal e não hesita em coibir tais práticas delituosas”. Conforme a Marinha, os dois militares que viraram réus foram imediatamente afastados das funções, ainda na fase do IPM.

Defesas contestam

O advogado Fábio Hypolitto defende dois despachantes e diz que, durante o IPM, eles não puderam apresentar as suas provas. “Durante o processo penal, com a garantia do contraditório e da ampla defesa, será demonstrado que são inocentes”.

Defensores de outro despachante, os advogados Valéria Bernardes Vieira e Wagner Bernardes Vieira declaram que “que não há nos autos qualquer elemento que incrimine o seu cliente, acreditando veementemente na absolvição do mesmo”.

A defesa do suboficial não retornou ligação feita pelo Vade News, que não conseguiu contato com os advogados de outros dois despachantes. O advogado Pedro Luiz Bizzo defende outro réu, “que é dono de marina, não despachante, e nada fez nada de irregular”, segundo frisa.

Alexandre Vasconcellos Lopes, advogado do primeiro-sargento, afirma que o IPM não comprovou nenhum depósito ou transferência suspeita na conta do militar, alegando que a senha pessoal dele deve ter sido usada indevidamente por alguém, porque as fraudes ocorreram fora da Capitania dos Portos.

 

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