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18/12/2022

“Prova rica” sem individualizar condutas resulta na absolvição de 11 por tráfico

Por Eduardo Velozo Fuccia

Conversas telefônicas interceptadas com autorização judicial podem representar “rica prova” relacionada aos crimes de tráfico e associação para o tráfico, mas não são suficientes para embasar uma condenação, se as condutas dos réus não forem individualizadas. Do mesmo modo, o mero depósito de dinheiro de origem ilícita em contas de terceiras pessoas não é apto para configurar o delito de lavagem de dinheiro, que exige a intenção de “ocultar” os valores.

Com essa fundamentação, por maioria de votos, a 12ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu provimento aos recursos de apelação das defesas de dez homens e uma mulher para absolvê-los desses delitos. A Vara Única de Cananeia condenou o grupo a penas que variam de seis anos, três meses e sete dias a até 34 anos, cinco meses e 22 dias. Alguns dos réus também foram sentenciados pelo delito de organização criminosa, pois seriam ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC).

Os acusados são da Baixada Santista e do extremo sul do litoral paulista. Segundo o Ministério Público (MP), eles se associaram para comercializar drogas nessas regiões, estando ainda unidos em uma organização mais ampla e estruturada para o cometimento de outros crimes, entre os quais o de lavagem de dinheiro. Com base em interceptações telefônicas, a denúncia narra dez eventos de tráfico, dois de branqueamento de capitais e seis de integrar organização criminosa.

O advogado William Cláudio Oliveira dos Santos apelou em favor de dois integrantes da suposta organização criminosa

Sem materialidade

O desembargador Amable Lopez Soto, relator dos recursos, anotou que, “embora o MP tenha trazido aos autos rica prova consistente em conversas interceptadas, não se desincumbiu de individualizar as condutas dos acusados, apontando quais as provas lastreariam a acusação de associação para o tráfico”. Em relação ao delito de tráfico, o julgador ainda destacou a falta de materialidade, “visto que nenhuma droga foi apreendida”.

Segundo o relator, na “mesma linha” da denúncia, a sentença fundamentou que “sem delongas, referido crime resta absolutamente demonstrado com a análise da demonstração das imputações […]”. No entanto, não foram apontadas quais provas lastreariam a acusação. O desembargador Vico Mañas acompanhou Soto. O revisor, desembargador Sérgio Mazina Martins, quis prover os recursos em menor extensão, sendo voto vencido.

Em relação à lavagem de dinheiro, o acórdão reconheceu que ficou demonstrada a origem ilícita de valores depositados para terceiros sob a orientação do réu que recebeu a maior pena, mas ressalvou: “O mero depósito de valores de origem ilícita, em conta bancária de titularidade de terceira pessoa, não configura o delito imputado aos réus, sendo necessária a presença de outros elementos que demonstrem sua intenção de ‘branquear’”.

O advogado William Cláudio de Oliveira dos Santos defende a única mulher do grupo e o réu sentenciado a 34 anos. Em relação ao acusado, o defensor teve acolhida em seu recurso a arguição preliminar de litispendência, específica ao crime de integrar organização criminosa, porque o cliente responde pelo mesmo delito em outra ação penal, que tramita pela 1ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo. No mérito, William Cláudio teve providos os seus pedidos de absolvição pelos demais delitos.

A 12ª Câmara de Direito Criminal apenas manteve as condenações de outros quatro corréus, por organização criminosa, mas reduziu as suas sanções. O juízo de primeiro grau fixou as penas-bases acima do mínimo legal em razão da personalidade voltada à prática de crimes, porque os acusados integram organização criminosa. “Ocorre que a conduta de integrar organização criminosa é a própria conduta delitiva pela qual foi condenado, não sendo fundamentação idônea”, observou o relator.

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