
Idosa é absolvida por tráfico referente a drogas achadas no quarto do filho
Por Eduardo Velozo Fuccia
Em uma denúncia de tráfico contra duas pessoas, que resulte em posterior apreensão de drogas e na prisão em flagrante de apenas uma delas, porque a outra estava ausente, é necessário que se comprove a identidade de desígnios entre ambas para o cometimento do suposto crime. Sem essa prova, não há como condenar quem foi capturado.
Com esse entendimento, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) deu provimento ao recurso de apelação de uma idosa para absolvê-la dos crimes de tráfico de drogas e posse ilegal de munições de uso permitido e restrito. Esses materiais ilícitos foram encontrados no quarto de seu filho.
“Notória a existência de dúvidas sobre a vinculação subjetiva das drogas e munições com a apelante, uma vez que não há certeza nos autos acerca da ciência da ré sobre os materiais ilícitos encontrados dentro do quarto do filho”, assinalou o desembargador José Conrado Kurtz de Souza, relator do recurso.
A acusada foi representada na fase de apelação pelo advogado Diego dos Anjos Elias Antonio, que sustentou a falta de liame psicológico entre a cliente e o filho. Conforme o defensor, o quarto do outro suspeito ficava trancado e a ré ignorava que dentro dele, em um guarda-roupa, havia drogas e munições.

O juízo da 2° Vara Criminal de Santa Maria condenou a ré pelos dois delitos. As penas totalizaram cinco anos e seis meses de reclusão, em regime inicial semiaberto. O Ministério Público queria a condenação pelo tráfico nos termos do caput do artigo 33 da Lei 11.343/2006, mas foi aplicada a redução do parágrafo 4º (tráfico privilegiado).
Diego Elias pleiteou na apelação a absolvição por insuficiência de prova, porque não se comprovou a autoria em relação à recorrente. Ele argumentou que a condenação se baseou exclusivamente no encontro das drogas e munições realizadas na casa da ré e na palavra dos policiais que cumpriram mandado de busca e apreensão no local.
O relator observou que a materialidade dos crimes ficou comprovada e a própria acusada a reconheceu. Porém, o mesmo não ocorreu quanto à autoria. “Não há prova suficiente de vinculação subjetiva da apelante com as drogas ilícitas e munições apreendidas, de modo que as lacunas fático-probatórias presentes nos autos impedem a condenação”.
Segundo o julgador, os dois policiais civis participantes do cumprimento do mandado de busca se limitaram a afirmar em seus depoimentos que houve uma “denúncia anônima” sobre o envolvimento de mãe e filho. “Não houve investigações mais profundas sobre como estaria sendo desenvolvida a suposta comercialização de entorpecentes no local”.
Kurtz destacou que, conforme a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a caracterização do crime de tráfico de drogas até prescinde de apreensão de droga em posse de cada um dos acusados. Todavia, o mesmo entendimento exige a demonstração do liame subjetivo entre os agentes.
Com o voto do relator sendo acompanhado por unanimidade pelos colegas de câmara, o colegiado absolveu a apelante com base no princípio do in dubio pro reo. “Não se tem como extrair um juízo de condenação, salvo forte dose de presunção, que, evidentemente, não pode militar em desfavor da ré”, concluiu o acórdão.
Diligência antecipada
As drogas e munições foram apreendidas em junho de 2023. Com 65 anos de idade na época, a apelante estava sozinha em casa, porque o filho havia sido preso em flagrante dias antes sob a acusação de transportar 13 quilos de skunk (supermaconha) em outra cidade do interior gaúcho.
Ao saberem da prisão desse suspeito por outros policiais, os investigadores que requereram o mandado de busca para a sua casa decidiram cumprir a ordem judicial antes da data inicialmente prevista. No imóvel havia 174 comprimidos de ecstasy, três porções de maconha (sete gramas) e seis munições (uma de fuzil e cinco de pistola).
Presa em flagrante, a idosa obteve o benefício da liberdade provisória. Após a condenação em primeiro grau, ela pôde aguardar solta ao julgamento da apelação. No interrogatório judicial, além de ignorar a existência das drogas e munições, a ré alegou que o filho não deixava que entrassem no seu quarto, o qual ficava trancado durante a sua ausência.
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