
Sem prova de dolo, TRF-3 absolve ex-cúpula da Codesp por fraude a licitação
Por Eduardo Velozo Fuccia
A avaliação isolada da gestão de uma companhia e da aptidão profissional dos seus administradores, por mais que possa ter sido questionada por auditoria interna e pela Controladoria-Geral da União (CGU), não é suficiente para comprovar eventual dolo e nem possui qualquer impacto na esfera penal, por falta de tipicidade adequada.
Essa conclusão é da 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) ao manter a absolvição de 11 pessoas pelos crimes de fraude a licitação e peculato, apurados pela Polícia Federal na Operação Tritão. Oito réus integravam a cúpula da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), atual Autoridade Portuária de Santos (APS).
Relator do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Federal (MPF), o desembargador federal Fausto De Sanctis pontuou que “não emerge dos autos, com a clareza necessária, terem os acusados agido com dolo, vale dizer, a vontade de desviar valores pertencentes à Codesp em proveito próprio ou alheio”.
Do mesmo modo, De Sanctis não vislumbrou que os apelados tiveram a intenção de frustrar ou fraudar o caráter competitivo de procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação – serviço de segurança no Porto de Santos mediante o monitoramento por drones.
O certame foi vencido pela empresa Vert em 2018, sendo celebrado contrato com prazo de 12 meses, no valor de R$ 2,7 milhões. Segundo o MPF, os réus teriam desviado valores referentes a pagamentos por serviços que não chegaram a ser prestados pela ganhadora da licitação, causando prejuízos à Administração Pública.
“Por mais que tenha sido questionável o remanejamento de recursos para viabilizar a contratação, tendo em vista que à época a companhia se encontrava com fluxo de caixa deficitário, tal fato, por si, não apresenta qualquer relevância no meio penal, tampouco é suficiente para demonstrar o dolo de qualquer dos acusados”, constatou o relator.
De Sanctis rejeitou as razões recursais do MPF e acolheu os argumentos dos advogados dos acusados, entre os quais o de que a homologação da licitação se baseou em pareceres técnicos de outros funcionários da Codesp. Os autores desses estudos de viabilidade não chegaram a ser denunciados pelo MPF.
Segundo o relator, os pareceres não são “esdrúxulos ou desarrazoados”, não podendo “pequenos indícios” servirem de prova de que os réus quiseram lesar a companhia. Além disso, tais vícios procedimentais não impediram que três empresas apresentassem propostas com valores próximos entre si, tendo a Vert vencido por ter o menor preço.
“Não se comprovou qualquer comunicação pessoal ou conluio entre os acusados, enriquecimento ilícito, recebimento de vantagem indevida ou depósito sem origem comprovada em favor dos réus”, frisou o julgador. Com o recurso improvido, a sentença do juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal de Santos, foi ratificada.
Ao rotular de “didática” a sentença por “discernir a complexidade dos fatos narrados pela acusação”, De Sanctis acrescentou que o ordenamento jurídico veda a responsabilização penal objetiva. Desse modo, os acusados detentores de posição de direção na companhia não poderiam ser condenados apenas em razão dos seus cargos.
A decisão da 11ª Turma do TRF-3 foi unânime. O acórdão será publicado na próxima segunda-feira (7). Conforme a sua ementa, “apesar da possibilidade de que os fatos judicializados sejam eventualmente criticados sob o ângulo administrativo, na ótica criminal, não refletem a maquinação dolosa característica do delito sob exame”.


Os advogados José Luiz Moreira de Macedo, Fábio Spósito Couto e Luiz Antônio da Cunha Canto Mazagão defenderam um dos acusados, que fazia parte da Codesp e foi o gestor do contrato celebrado com a empresa privada. Segundo eles, apesar da investigação da PF, nada contra o cliente deles e os demais réus ficou comprovado.
“A acusação apontava favorecimento à empresa contratada e possíveis vínculos políticos. No entanto, após análise judicial, nosso cliente foi absolvido por falta de provas, com a Justiça reconhecendo que ele não participou da fase de licitação e que não houve demonstração de dolo ou conduta criminosa”, detalhou Macedo.
O advogado Eugênio Carlo Balliano Malavasi defendeu o superintendente jurídico da Codesp à época dos fatos e disse que o cliente não integrava a diretoria executiva da estatal e, portanto, não detinha poder decisório, tampouco a atribuição para adjudicar o objeto da licitação. “Ele não agiu com dolo, tendo apenas cumprido seu dever funcional”.
Os absolvidos:
José Alex Botelho Oliva, ex-presidente da Codesp
Francisco José Adriano, ex-diretor-financeiro da Codesp
Carlos Henrique de Oliveira Poço, ex-diretor de operações e logística da Codesp
Sérgio Pedro Gammaro Júnior, ex-superintendente de tecnologia da informação da Codesp
Gabriel Nogueira Eufrásio, ex-superintendente jurídico da Codesp
Tawan Ranny Sanches Eusebio Ferreira, ex-gerente de contratos e licitações da Codesp
Álvaro Clemente de Souza Neto, assumiu a gestão do contrato com a Vert
Cristiano Antônio Chehin, fiscal do contrato com a Vert
José Eduardo dos Santos, responsável pela empresa Vert
Otoniel Pedro Alves, apontado pelo MPF como diretor da Vert
Oseas Pedro Alves (irmão de Otoniel), apontado pelo MPF como integrante da Vert
Foto principal: Divulgação/APS
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