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11/07/2019

Galo é motivo de divergência entre magistrada e promotora de justiça na Bahia

Por Eduardo Velozo Fuccia

O afã punitivista de uma promotora, que denunciou um homem por supostos maus-tratos a um galo, foi rechaçado pela juíza Ana Paula Fernandes Teixeira, da 1ª Vara do Sistema dos Juizados de Serrinha, município baiano a 175 quilômetros da capital Salvador.

Ao rejeitar a acusação formal da representante do Ministério Público (MP), a magistrada justificou que, “seguindo os preceitos da intervenção mínima, a função do Direito Penal é proteger os bens mais importantes e necessários ao convívio em sociedade, devendo apenas estes serem amparados pela legislação”.

A história do galo teve início quando a própria promotora, conforme ela relata em sua denúncia, surpreendeu João Dantas de Souza carregando um galo com a cabeça para baixo e de pés atados. O humilde homem esclareceu que levava a ave para a casa da irmã, pois a intenção seria abatê-la para o almoço de domingo de Páscoa da família.

A promotora juntou à sua acusação formal parecer técnico. Segundo o documento, o ato de transportar animal pelas pernas, de cabeça para baixo, compromete a sua saúde física e mental. No entanto, a juíza observou que a conduta do acusado não se enquadra no crime descrito no Artigo 32 da Lei 9.605/1998.

Sem intenção não há crime

De acordo com essa regra, é crime “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”. No entanto, a magistrada frisou que tal delito tem como elemento subjetivo o dolo, ou seja, a intenção livre e consciente de causar sofrimento ao animal.

A juíza assinalou que o Artigo 37 da mesma lei não considera crime o abate de animal quando realizado “em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família”. Desse modo, Ana Paula considerou a conduta de Dantas “uma prática aceitável na cultura alimentar das cidades do interior”, além de autorizada pelo Direito.

Para a magistrada, o denunciado, “homem simples, do interior”, apenas carregou a ave de cabeça para baixo, por uma distância de cerca de 200 metros, porque esse é o “jeito mais seguro e eficaz para quem conduz um animal desse tipo, que, invariavelmente, tentaria bicar ou fugir, se fosse levado de outra forma”.

Com essa fundamentação, a juíza rejeitou liminarmente a denúncia por falta de justa causa para a ação penal:

Admitir transformar uma conduta rotineira e desprovida de dolo em crime seria andar na contramão de todo o Direito Penal atual, que deve ser a ultima ratio (último recurso) para a solução dos conflitos”.

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