
Sem risco à apuração penal, leilão de avião alvo de sequestro é suspenso
Por Eduardo Velozo Fuccia
O uso de um bem sequestrado não compromete a eficácia da persecução penal, ao contrário, ele pode ser até mais útil para garanti-la, desde que supervisionado pelo juízo que decretou a medida assecuratória. Com essa conclusão, o juiz federal convocado Leonardo Augusto de Almeida Aguiar, do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), acolheu pedido da defesa de um empresário e suspendeu o leilão de uma aeronave.
O leilão havia sido determinado pelo juízo da 3ª Vara Federal Criminal de Belo Horizonte (MG), nos autos de ação penal derivada da operação Terra Fértil, da Polícia Federal, que apura o crime de lavagem de dinheiro cometido por organização criminosa ligada ao tráfico internacional de drogas. De acordo com a PF, em cinco anos, o grupo teria movimentado mais de R$ 5 bilhões.
O advogado Henrique Perez Esteves interpôs apelação, sustentando violação aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade da medida de alienação antecipada do avião, além do risco de dano irreparável se ocorresse o leilão. O juízo de origem recebeu o recurso apenas em seu efeito devolutivo, mantendo em curso o procedimento para a hasta da aeronave – um jato executivo fabricado pela Embraer, modelo Phenom 300.
No entanto, o julgador do TRF-6 determinou a imediata suspensão do leilão. “Verifico que se encontram presentes os requisitos para a concessão, em caráter excepcional, do efeito suspensivo ao presente recurso. O risco de perecimento do direito decorre da iminente alienação de bem lícito, de valor elevado e com relevante diferença de avaliações, podendo esvaziar o objeto do recurso de apelação”.

Alienação antecipada
O juízo da 3ª Vara Federal Criminal da capital mineira embasou a sua decisão de leiloar o avião no artigo 144-A do Código de Processo Penal (CPP). Essa regra autoriza a alienação antecipada para a preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.
O parágrafo 2º do mesmo artigo complementa que os bens deverão ser vendidos pelo valor fixado na avaliação judicial ou por outro superior. Porém, caso não se alcance a quantia estipulada pela administração judicial, será realizado novo leilão, em até dez dias contados da realização do primeiro, podendo ocorrer a alienação por importância não inferior a 80% da inicialmente calculada.
Leonardo de Aguiar ponderou que a manutenção do sequestro, “sob rigorosas condições de controle”, assegura a preservação do bem sem comprometer a eficácia da persecução penal. Nessa linha de entendimento, observadas certas medidas, ele autorizou que o recorrente retome a exploração da aeronave no serviço de táxi aéreo, como fazia antes da medida assecuratória, que continua a valer exclusivamente como restrição registral.
As condições impostas para o empresário explorar comercialmente o avião são as de que a aeronave não saia do território nacional e seja realizado depósito judicial dos valores oriundos dessa atividade econômica. O recorrente também deve apresentar relatórios mensais ao juízo de origem contendo informações sobre voos operados, manutenções executadas, custos e saldos financeiros.

Interesse público
O Ministério Público Federal (MPF) concordou com a permissão de uso do avião durante o seu sequestro, bem como com as condições impostas pelo TRF-6. Conforme parecer do órgão, na hipótese de futura condenação, os valores arrecadados no serviço de táxi aéreo poderão ser revertidos para ressarcir eventuais prejuízos advindos da prática delituosa, “de forma a demonstrar o interesse público envolvido na autorização”.
Segundo o advogado, a aeronave permanece estacionada em hangar no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, desde a decretação do sequestro, gerando elevados gastos diários. Segundo ele, não há motivo que justifique a manutenção de sua apreensão, porque os fatos apurados na Operação Terra Fértil são posteriores à aquisição da aeronave e inexiste nexo de causalidade entre o bem sequestrado e a infração imputada.
Henrique Esteves acrescentou que laudo contábil explicita o lastro financeiro do empresário por ocasião da compra do jato, além da origem lícita dos recursos empregados na transação. Conforme avaliação judicial, o avião foi cotado em R$ 37,3 milhões, mas ele poderia ser arrematado por R$ 29,8 milhões, se a primeira tentativa de leilão fosse frustrada. O advogado estimou em R$ 55 milhões o valor real da aeronave.
Além da área de transporte aéreo, o empresário, que é de Santos, atua no setor cafeeiro. O advogado explicou que o cliente entrou no radar da PF porque tinha vendido outra aeronave e o intermediário desse negócio, posteriormente, passou a ser investigado como suposto integrante de organização criminosa ligada ao tráfico internacional. Esse suspeito foi preso em julho de 2024, em um apartamento de luxo em Guarujá.
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