Perto de se aposentar, desembargador avalia convites para se candidatar a prefeito
Por Eduardo Velozo Fuccia
Nascido em São Paulo e com 62 anos de idade, ele está em contagem regressiva para encerrar a carreira de 38 anos na magistratura paulista. No próximo dia 11 de março, a sua aposentadoria deve ser publicada no Diário Oficial do Estado. Porém, analisa “com carinho” os convites de três partidos políticos para se candidatar a prefeito de Santos nas eleições de 2020, sem descartar a hipótese de advogar no escritório de um dos filhos.
Noviço na política e sem integrar partido político em razão da vedação legal devido ao cargo de magistrado, mas com experiência administrativa resultante do exercício da presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), no biênio 2012/2013, o desembargador Ivan Ricardo Garisio Sartori não atribui a sua precoce aposentadoria à possibilidade de migrar do Poder Judiciário ao Executivo.
Casado, com três filhos e uma neta, o membro da 4ª Câmara de Direito Criminal do TJSP ingressou no Judiciário em 1981. Foi o mais jovem presidente do Tribunal, aos 55 anos, tendo sido eleito e reeleito para compor o Órgão Especial da corte. Mudou-se para Santos em 1994. Condecorado pela Câmara Municipal com o título de Cidadão Santista, é professor de Direito Civil na Universidade Santa Cecília (Unisanta) desde 2009.
Acompanhe entrevista:
O sr. ainda é novo e poderia continuar no TJSP até os 75 anos, idade da aposentadoria compulsória. A que se deve a sua despedida precoce do Judiciário, se é que podemos classificá-la assim?
Eu me desencantei com a magistratura. Não é mais prestigiada como na época em que nela ingressei. O volume de serviço é avassalador. O juiz virou um tarefeiro, face ao grande número de processos. A imprensa denigre o Judiciário, que perdeu o controle de si próprio com os magistrados de fora, políticos. Os magistrados deveriam ser só concursados, de carreira.
Mas rumores dão conta de que o sr. está sendo sondado para disputar a Prefeitura de Santos no próximo ano. Procede?
Sim, recebi três convites de partidos distintos e os analiso com carinho. Mas a minha aposentadoria não tem relação com isso.
Quais são os partidos?
Como ainda estou vinculado ao Judiciário e ainda nada decidi, prefiro não revelar. Não sou filiado a nenhum deles e nem poderia, por força do cargo de juiz.
A sua decisão quanto à possível candidatura sai logo?
Após me aposentar, pensaremos nisso, mas precisamos ter calma. Penso até em advogar com o meu filho. Preciso avaliar as condições, as possibilidades.
Mas o sr. sente-se com vigor para o eventual desafio de comandar outro poder, no caso o Executivo municipal, porque o Judiciário já chefiou?
Estou em plena forma, com energia, mas ainda nada definido. Tudo está sob análise, inclusive na dependência do aval da família, além do convencimento próprio.
Ainda sobre política, uma reforma nessa área deveria contemplar prioritariamente o que, se tivesse que indicar apenas uma medida?
Sem dúvida, a obrigatoriedade do cumprimento do tempo integral do mandato para se candidatar a outro cargo eletivo. O eleitor tem que ter essa segurança, de ter o seu representante no cargo para o qual foi eleito até o final do mandato.
Sobre o Ivan Sartori magistrado, como podemos resumir a sua experiência de presidir o TJ?
O Tribunal de Justiça de São Paulo é o maior do mundo. São 360 desembargadores e 85 juízes substitutos. No Estado há 2.600 juízes, 60 mil auxiliares da Justiça e cerca de 10 mil funcionários terceirizados. O orçamento anual é de quase R$ 10 bilhões, superior a de muitos municípios e até de capitais. Deste montante, cerca de 80% são destinados à folha de pagamentos. Em nossa gestão, implantamos o processo digital, que agilizou os trabalhos. São cerca de 25 mil ações ajuizadas diariamente em São Paulo.
Então, enquanto presidente do TJ, o sr. colocou a toga no cabide para exercer uma função eminentemente administrativa?
O exercício da presidência do TJSP não é só uma atividade administrativa. Ela também é política, porque o presidente é chefe de poder, eleito pelos seus pares. Porém, sem perder o seu caráter judicial, porque o presidente do Tribunal, nessa qualidade, tem assento no Órgão Especial, com o vice-presidente e o corregedor-geral, além dos desembargadores mais antigos e outros eleitos, totalizando 25. E o Órgão Especial tem a competência para processar e julgar juízes e outras autoridades, como se fosse o STF do Estado.
O sr. falou sobre o elevado número de ações ajuizadas por dia no Estado. O que pode ser feito para reverter essa realidade?
Precisamos buscar alternativas para desjudicializar certos conflitos que atualmente são encaminhados ao Judiciário. As centrais de conciliação e as câmaras de mediação e arbitragem são iniciativas que têm dado bons resultados, com o acompanhamento da OAB e a homologação dos acordos por um juiz de direito. Os cartórios também contribuem nesse processo, realizando, por exemplo, alguns divórcios.
Em recente pronunciamento no TJSP, o sr. criticou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), afirmando que o órgão interfere na administração das cortes e “passou a controlar cada passo, inclusive, da vida pessoal do juiz”. Esse posicionamento tem a ver com o fato ser aberta apuração contra o sr. no CNJ?
O que ocorreu é que, enquanto eleitor e cidadão, nas últimas eleições, eu me manifestei pelo Facebook com o lema “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”, tendo a bandeira do Brasil, que é um símbolo nacional, ao fundo. Mas essa representação não vingou, nem poderia, por ausência de justa causa. Foi arquivada por decisão unânime do plenário do CNJ.
Como o sr. avalia o pacote anticrime do ministro Sérgio Moro?
Gostei, principalmente, no tocante às regras mais rígidas de progressão de pena para o criminoso habitual e perigoso. Também é boa a proposta de elasticidade da legítima defesa aos agentes de segurança pública em serviço, porque eles não podem cumprir bem a sua missão se estiverem vulneráveis juridicamente. A repressão mais enérgica ao porte de fuzil é outra medida salutar.
Qual a sua opinião sobre a pena administrativa de aposentadoria compulsória dos magistrados, que é a mais severa, mas sem a perda dos vencimentos?
Antes de ser presidente do TJSP, fui relator do Regimento Interno do Tribunal e inseri dispositivos sobre a perda do cargo do juiz aposentado compulsoriamente, desde que o Ministério Público ajuíze ação com essa finalidade, que inclusive pode ser de improbidade. Esses dispositivos têm por base a Constituição Federal e, sendo decretada a perda do cargo, consequentemente, o magistrado perde o direito aos vencimentos. Mas o MP deve agir nesses casos em que o juiz agiu mal.
Entrevista publicada em A Tribuna, em 16/2/2019