Máfia santista dos pátios de trânsito: um esquema criminoso sem condenados
Por Eduardo Velozo Fuccia
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve decisão do juiz José Romano Lucarini, da 1ª Vara Criminal de Santos, que absolveu por insuficiência de provas sete pessoas acusadas de participar do esquema conhecido por máfia dos pátios de trânsito.
O episódio revela um caso clássico de impunidade, porque a Justiça em primeira e segunda instâncias não teve dúvidas quanto ao esquema criminoso, mas apontou a falta de provas necessárias para fundamentar a condenação dos réus.
“Conforme bem lançado em respeitável sentença, embora possam existir indícios de que os acusados tenham praticado os delitos mencionados, certo é que restaram sérias dúvidas, as quais devem beneficiar os acusados”, disse o desembargador Fábio Gouvêa.
Relator do recurso de apelação do Ministério Público (MP), Gouvêa teve o seu voto acompanhado pelos dos desembargadores Rachid Vaz de Almeida e Francisco Bruno, o que tornou unânime a decisão da 10ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP.
O MP denunciou os acusados por peculato e associação criminosa, porque eles teriam se unido para furtar veículos e autopeças que estavam apreendidos em dois pátios de trânsito de Santos. Os delitos ocorreram de forma reiterada, entre 2008 e 2011.
Ainda conforme a acusação do Ministério Público, os crimes foram cometidos em proveito próprio e alheio dos acusados, que se valeram do exercício da função pública. Entre os réus estão os dois gestores dos pátios na época.
Situados na Avenida Francisco Ferreira Canto, 351, na Caneleira, e no km 247 da Rodovia Cônego Domênico Rangoni, no Monte Cabrão, os pátios eram gerenciados pela Marthas Serviços Gerais.
A gestão pela empresa privada decorreu de contrato celebrado com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de Santos. Após o escândalo vir à tona, a CET rompeu o vínculo com a terceirizada e assumiu a guarda dos veículos.
Inquérito policial identificou 28 casos de veículos recolhidos aos pátios que tiveram peças furtadas ou substituídas por outras de qualidade inferior, quando não foram depenados por completo ou simplesmente desapareceram.
Apesar de reconhecerem em juízo que os furtos aconteceram, os acusados negaram tê-los praticado. No caso específico dos gestores dos pátios, eles acrescentaram que, na condição de administradores, não ficavam o tempo inteiro nesses locais.
O acórdão do TJ-SP destacou que laudo anexado ao processo constatou ser o pátio do Monte Cabrão imenso e mal vigiado, sendo possível a entrada de pessoas não autorizadas, conforme chegaram a alegar alguns réus.
“As várias subtrações ocorreram mesmo. Isso é incontestável. Se esta fosse uma ação civil, a indenização seria certa”, sentenciou Lucarini. Porém, ele ressalvou que o processo é criminal, sendo as provas de autoria “vazias e inconcludentes” para condenar.
Defensor de três réus, o advogado William Cláudio Oliveira dos Santos elogiou a sentença e o acórdão, sob o aspecto jurídico. “Diante de dúvidas e da ausência de provas de autoria, deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo (na dúvida, absolve-se)”.
Em um dos casos mais flagrantes da máfia dos pátios, um ônibus foi completamente desmontado, sobrando somente o chassi. Na sentença ou no acórdão não consta notícia de um lesado sequer que tenha sido ressarcido pela CET ou pela terceirizada Marthas.