Ministra ordena retirada de documento feito pelo MP para ser usado em júri
Por Eduardo Velozo Fuccia
A produção de documento com a chancela do Ministério Público, que lhe confere pretenso status de “oficial”, para posterior utilização pelo próprio MP em sessão do tribunal do júri, não pode ser admitida, sob pena comprometer a paridade de armas entre acusação e defesa.
Com essa fundamentação, para manter o equilíbrio entre as partes, a ministra Daniela Rodrigues Teixeira, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão monocrática, concedeu habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública do Rio Grande do Sul (DPE-RS) em favor de um corréu em processo de competência do júri.
A julgadora determinou que a documentação produzida pelo MP, com base em informações do sistema de consultas integradas, seja desentranhada dos autos de ação penal de tentativa de homicídio, na qual também é apurado o crime conexo de coação no curso do processo.
“A paridade de armas no processo penal, mormente no seu paroxismo, que é o júri, deve ser valorada com rigor, em observância da ampla defesa, do devido processo legal e de um contraditório em que nenhuma das partes coloque-se acima da outra ou possa dispor de instrumentos de peso maior”, justificou Daniela Teixeira.
Segundo ela, “permitir que a parte utilize de documentos elaborados por si mesma como chancelado por autoridade e usá-lo para influenciar a percepção da conduta do réu no tribunal do júri, por meio de elementos não relacionados ao crime de que é acusado, atenta contra a horizontalidade necessária de tratamento entre acusação e defesa”.
A DPE-RS havia feito pedido liminar, porém, como ele se confunde com o próprio mérito, a ministra concedeu de plano o habeas corpus. Em sua decisão, ela citou precedente da 5ª Turma do STJ, por ocasião do julgamento do Agravo Regimental em Recurso de Habeas Corpus 80.551/RS, sob a relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca.
“A leitura de peças de caderno processual que apura fatos diversos, que em nada ajudam a elucidar a controvérsia destes autos, exsurge manifesto prejuízo à defesa, diante da possibilidade concreta de que tais declarações possam, efetivamente, ter influenciado no julgamento proferido pelo conselho de sentença”, diz o precedente.
Delito conexo
No caso concreto, o paciente do habeas corpus foi denunciado pelo crime de coação no curso do processo nos mesmos autos da ação de tentativa de homicídio da qual o seu irmão é acusado. Devido à conexão entre os delitos, ambos serão submetidos ao julgamento popular.
Em relação ao corréu acusado do crime de coação no curso do processo, o MP elaborou documento para traçar o seu perfil com base em dados obtidos na Rede de Integração Nacional de Informações de Segurança Pública, Justiça e Fiscalização (Rede Infoseg), juntando-o nos autos.
A DPE-RS pleiteou a retirada da documentação do processo, porém, a 1ª Vara do Júri do Foro Central de Porto Alegre indeferiu o pedido. Essa decisão motivou a defesa a interpor correição parcial, mas 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), por maioria de votos, vencido o relator, ratificou a decisão de primeiro grau.
No habeas corpus ao STJ, a DPE-RS alegou que não se insurge contra a juntada de antecedentes criminais, mas de documentos elaborados pelo próprio MP com base no Infoseg, porque eles tratam de condutas do paciente não relacionadas à tentativa de homicídio a ser julgada pelo conselho de sentença.
A Defensoria Pública sustentou que os antecedentes criminais já bastam para apurar a dosimetria da pena, sendo desnecessárias e indevidas outras informações sob a aparência de documento, porque elas podem influenciar os jurados e violar a igualdade que deve existir entre acusação e defesa.
Foto: Gustavo Lima/STJ
*Curta https://www.facebook.com/portalvadenews e saiba de novos conteúdos