Mulher é condenada a indenizar policial por chamá-lo de “macaco” em delegacia
Por Eduardo Velozo Fuccia
Ofensa de teor racista, que visa a diminuir a dignidade humana, não pode ser justificada por eventual abuso de autoridade, despreparo ou injusta agressão por parte do insultado, nem por violenta emoção daquele que xinga. Assim decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) ao negar provimento ao recurso de apelação de mulher. Ela foi condenada a indenizar policial militar em R$ 20 mil, porque o chamou de “macaco” em delegacia.
O episódio ocorreu na frente de várias testemunhas, no 1º DP de Campinas, em 27 de fevereiro de 2012. O pai da mulher foi detido por PMs após discutir com outro homem. Bruna Gallo Ingrao, a acusada, chegou ao distrito e, segundo os policiais, xingou um deles, Christian Douglas de Almeida, com conotação preconceituosa. Autuada em flagrante por injúria racial, pagou fiança de R$ 8 mil e respondeu pelo crime solta.
Na esfera cível, Christian ajuizou ação de dano moral. No dia 14 de dezembro de 2018, o juiz Herivelto Araújo Godoy, da 8ª Vara Cível de Campinas, condenou Bruna a indenizar o policial militar em R$ 20 mil. Ele destacou na sentença que, na ofensa à honra, o dano moral independe de comprovação de sua existência, porque deriva do próprio insulto. É o chamado damnum in re ipsa.
A mulher recorreu. Em sua apelação, negou ter proferido xingamentos racistas, alegando que apenas retrucou ofensa feita pelo policial contra ela. Argumentou também que agiu em legítima defesa do pai, que sofreu “abuso de autoridade” dos PMs. Por fim, afirmou que os colegas de Christian agiram com corporativismo, acusando-a daquilo que não praticou para evitarem responsabilização pela detenção arbitrária.
Em decisão unânime, a 18ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP manteve a decisão de primeiro grau, inclusive quanto ao valor da indenização, por considerá-lo adequado à condição financeira das partes, além de proporcional e razoável em relação às peculiaridades do caso concreto. O acórdão é de 12 de novembro e se torna emblemático pela sua proximidade com o Dia Nacional da Consciência Negra (20).
É evidente que as injúrias raciais narradas provocaram danos morais à vítima, os quais independem de consideração acerca do contexto em que foram proferidas, uma vez que nenhum elemento fático isentaria a ré de responsabilidade pelas ofensas de cunho racial”, destacou o desembargador Hélio Faria, relator do recurso. Também julgaram a apelação os desembargadores Carlos Alberto Lopes e Israel Góes dos Anjos.
Pelo delito de injúria racial, o juiz Nelson Augusto Bernardes de Souza, da 3ª Vara Criminal de Campinas, condenou Bruna a um ano de detenção, em regime aberto, em 24 de outubro de 2014. Ele substituiu a pena privativa de liberdade por prestação de serviço à comunidade, em razão de a ré preencher requisitos legais. A acusada recorreu e a 13ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP, em 23 de março de 2017, confirmou a condenação.