TJ-BA rejeita tese de tortura policial e condena homem por tráfico em Salvador
Por Eduardo Velozo Fuccia
O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) reformou sentença para condenar acusado de tráfico de drogas e porte ilegal de arma que havia sido absolvido com base em suposta tortura praticada por policiais militares, em Salvador. A decisão afastou a teoria da árvore dos frutos envenenados, reconhecida em primeiro grau.
Conforme a Segunda Turma da 1ª Câmara Criminal do TJ-BA, a existência de um único ferimento, em forma de arco, sobre a clavícula esquerda, provocado por ação cortante, conforme laudo pericial, não reflete a versão do réu em juízo de que fora “espancado” e sofrera “diversas agressões”.
“A versão de que agentes policiais agrediram fisicamente o apelado quando da realização da diligência não desnatura a certeza da prática dos crimes de tráfico de drogas e de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito”, acrescentou o acórdão (decisão de segunda instância).
A decisão do TJ-BA foi por dois votos a um, prevalecendo o da desembargadora Rita de Cássia Machado Magalhães, relatora do recurso de apelação do Ministério Público (MP). Como não houve unanimidade, o advogado Rodrigo Menezes Coelho tentou reverter o entendimento do colegiado opondo embargos infringentes.
Nos embargos infringentes, o recurso de apelação é reapreciado pelos três desembargadores e por mais dois. Os votos dados inicialmente podem ser modificados. Por maioria de votos, no último dia 24, a Segunda Turma da 1ª Câmara Criminal rejeitou os embargos e manteve o acórdão que reformou a sentença para condenar o réu.
O TJ-BA apenou o réu a nove anos e quatro meses de reclusão, fixando o regime fechado para o cumprimento inicial das penas (cinco anos e dez meses por tráfico de drogas e três anos e seis meses por porte ilegal de arma de fogo de uso restrito). Na dosimetria foi considerada condenação do acusado por roubo de carro ocorrido na Pituba, em 2016.
Submetralhadora e cocaína
Augusto José Sacramento dos Santos, o Bacalhau, foi preso em flagrante na noite de 9 de junho de 2018, no bairro Nordeste de Amaralina. Segundo policiais militares, o acusado carregava uma submetralhadora com oito munições enrolada em uma camisa e trazia no bolso da bermuda 42 pinos (microtubos) contendo cocaína.
O MP denunciou Bacalhau por tráfico de drogas e porte ilegal de arma, requerendo a sua condenação por ambos os crimes. Em suas alegações finais, o advogado Rodrigo Coelho pediu a absolvição do réu. Ele alegou que o cliente foi torturado ao ser preso, razão pela qual as provas que fundamentaram a denúncia teriam sido obtidas por meios ilegais.
Em sentença prolatada em 30 de janeiro de 2019, a juíza Rosemunda Souza Barreto Valente, 1ª Vara de Tóxicos de Salvador, acolheu a tese defensiva para absolver Bacalhau sob o fundamento de não existir prova da existência do fato. Laudo que atestou lesão no réu foi levado em conta pela magistrada. O acusado sempre negou os crimes.
“Há possibilidade de ilegalidade das provas colhidas, sendo impositiva a aplicação do princípio do in dubio pro reo, pois, se a prova obtida é ilícita, não pode ser aceita, deixando de existir prova nos autos para condenação”, sentenciou a juíza. Segundo ela, a versão dos PMs perde credibilidade em face da possibilidade de serem os agressores.
“Com base no resultado do citado laudo, há indícios de que o réu sofreu agressões físicas na fase de inquérito. Por força da teoria ou princípio dos ‘frutos da árvore envenenada’ (fruits of the poisonous tree teory), a prova derivada de prova ilícita também é ilícita”, frisou a juíza, mencionando o parágrafo 1º, do Artigo 157, do Código de Processo Penal.
Rosemunda Barreto determinou na sentença a remessa de cópias do interrogatório do réu, dos testemunhos dos policiais e do laudo de lesões corporais ao Grupo de Atuação Especial para o Controle Externo da Atividade Policial (Gacep), órgão do MP, “para as providências legais cabíveis”.
Inconformado com a absolvição de Bacalhau, o MP apelou ao TJ-BA. Ao reformar a decisão da juíza, a Segunda Turma da 1ª Câmara Criminal referendou a versão dos PMs. “Não se vislumbra nos autos elemento probatório capaz de afastar a credibilidade dos depoimentos judiciais das testemunhas arroladas pela acusação”.