Mulher ostentadora tem mansão penhorada e CNH retida por dívida trabalhista
Por Eduardo Velozo Fuccia
A ostentação de uma mulher nas redes sociais serviu de prova para que uma juíza do Trabalho julgasse improcedente o embargo à execução de uma casa de elevado padrão, classificada pela embargante como “bem de família”. O imóvel foi penhorado em ação, ajuizada há 13 anos, que reconheceu crédito trabalhista, atualmente, estimado em cerca de R$ 30 mil. O exibicionismo da ré ainda lhe rendeu multa e apreensão da CNH.
“Ante o nítido comportamento da ré em retardar e fraudar a execução, reduzindo a respeitabilidade e a importância social do sistema Judiciário, condeno a embargante em multa de 20% do valor da causa por ato atentatório à dignidade da Justiça”, decidiu a juíza substituta Samantha Fonseca Steil Santos e Mello, da 5ª Vara do Trabalho de Santos. A julgadora enfatizou o caráter alimentar do crédito trabalhista.
“Dessa forma, tem-se que possível a penhora de imóvel bem de família de alto valor, em face do privilégio do crédito exequendo, de natureza alimentar, observados os princípios da razoabilidade, da dignidade da pessoa humana e da efetividade do processo. De fato, por se tratar de execução de crédito trabalhista, não é razoável que o executado ostente moradia de alto padrão, desobrigando-se de dívida que perdura há anos”, frisou a juíza.
De acordo com Samantha Steil, o objetivo da Lei nº 8.009/1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, é a de proteger a casa que serve de moradia ao núcleo familiar, “mas não o devedor inadimplente, que busca se esquivar através do dispositivo legal do cumprimento de suas obrigações, como se vislumbra no caso dos autos”. A sentença foi prolatada no dia 26 de fevereiro.
Paris e grifes famosas
Samantha Steil fez uma cronologia em sua sentença: “Em 5 de junho de 2022, no mesmo mês em que veio aos autos alegar impenhorabilidade do imóvel, a executada postou sua foto usando um casaco da marca Louis Vuitton, sendo que, possivelmente, uma única peça de roupa sua seria capaz de quitar o presente processo”. A magistrada também mencionou outras postagens.
Em 4 de janeiro de 2023, a ré publicou foto usando tênis da mesma grife. A juíza anotou em sua decisão que, “para começar o ano bem, como diz a expressão ‘com o pé direito’, nada melhor do que calçar também um Louis Vuitton no pé”. Diante de outra fotografia, na qual a executada segura um frasco de perfume, a julgadora ironizou que “também há espaço para Chanel – como não amar, não é mesmo?”.
Na linha do tempo que construiu, a julgadora da 5ª Vara do Trabalho de Santos lembrou-se do momento em que sentenciava. “Inclusive, no dia 25 de fevereiro de 2023, quando esta magistrada minutava essa decisão, em seus stories a executada exibia suas compras realizadas e falava o lema adotado no seu dia a dia: ‘dinheiro não traz felicidade, mas compra’”. Fotos da Torre Eiffel e da casa de luxo penhorada também foram citadas.
Dinheiro não falta
“O ostensivo padrão de vida, demonstrado pela própria executada, deixa indene de dúvidas que a executada não quita a sua dívida trabalhista porque não quer, porque não tem interesse em honrar um compromisso financeiro oriundo de um trabalhador, sendo que a mão de obra no país, por outro lado, é tida como uma das mais baratas do mundo”, destacou Samantha Steil.
Em uma das postagens que a julgadora trouxe para a sua decisão, a executada compartilhou a seguinte frase: “A vida é como um bumerangue, tudo que você lançar com intensidade, seja bom ou ruim, vai voltar em sua direção ainda mais forte”. A mensagem contou com a concordância da própria magistrada. “Por isso temos que ter muito cuidado com o que realmente fazemos e desejamos para as pessoas”.
O imóvel objeto do embargo à execução foi avaliado em R$ 2,2 milhões, sendo R$ 1,1 milhão a metade ideal penhorada. Ao rejeitar o pedido da ré, a magistrada ressalvou que a penhora é subsidiária, porque a casa apenas irá a leilão na hipótese de outros bens não serem suficientes para a quitação do débito trabalhista. Tais bens deverão ser penhorados por oficial de justiça com o auxílio de força policial, se necessário.
Medidas atípicas
A juíza determinou a “livre penhora de bens da residência, vez que fartamente provado o ostensivo padrão de vida, sendo que também deverão ser entregues especificamente os bens das fotos, quais sejam: casaco e tênis Louis Vuitton e as bolsas Chanel nas cores pretas e brancas”. Também foi determinada a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e do passaporte da embargante.
A juíza justificou a retenção desses documentos ante o recente julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.941, pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a validade de medidas atípicas coercitivas para assegurar o cumprimento de ordem judicial. Porém, como forma de se livrar da execução, a embargante tem a opção de pagar integralmente o seu débito trabalhista, conforme ressalvou a julgadora.
Por meio de pesquisa na ferramenta InfoJud (sistema de informações ao Judiciário), a magistrada constatou que a executada não elaborou declaração de rendimentos nos anos de 2020, 2021 e 2022, vislumbrando “nítida blindagem patrimonial”. Por esse motivo, a juíza também determinou que seja comunicada a Receita Federal “para, querendo, apurar eventuais irregularidades”.
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