Advogada é condenada a indenizar juiz por gravar conversa com ele no fórum
Por Eduardo Velozo Fuccia
“Todos os profissionais do direito, no exercício de suas profissões, devem inspirar confiança, lealdade e fidalguia entre si, como funções essenciais à justiça, bem como na coletividade, devendo-se repudiar condutas que atentem ao equilíbrio das relações profissionais de classe”.
Embora pareça uma cartilha de comportamento, essa frase faz parte da sentença que condenou uma advogada a pagar indenização de R$ 10 mil, por dano moral, a um juiz pernambucano. De modo clandestino, a ré gravou uma conversa que manteve com o magistrado, no gabinete dele, no fórum da comarca de Petrolina.
“Sob qualquer ponto de vista, a gravação ambiental clandestina de conversa entre o magistrado(a) e o(a) advogado(a) no exercício de seus ofícios profissionais traduz deslealdade, violação de ética profissional que não deve ser prestigiada e muito menos tolerada no seio da classe advocatícia”, sentenciou o juiz Josilton Antonio Silva Reis, do 2º Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo de Petrolina.
De acordo com Reis, a conduta da requerida afeta a boa-fé nas relações profissionais e não se coaduna com o papel do advogado, enquanto defensor do Estado Democrático de Direito e no exercício de função essencial à administração da Justiça. Cabe recurso da decisão. O magistrado autor da ação havia pedido R$ 20 mil de indenização.
Segundo a inicial, a gravação ambiental clandestina ocorreu durante atendimento do juiz à advogada, referente a um processo da 4ª Vara Cível de Petrolina. Com base no áudio, ela denunciou o autor no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJ-PE) por suposta desídia no exercício da função, atingindo a sua honra e causando-lhe dano moral.
A requerida sustentou a licitude da sua conduta e alegou que a demanda tem por objetivo intimidar e coagir os advogados a não realizarem reclamações nos órgãos correcionais competentes, além de buscar indevida vantagem econômica com o pleito indenizatório. A advogada requereu a improcedência da ação e a condenação do juiz por “litigância de má-fé por abuso do direito de ação e alteração da verdade dos fatos”.
Tese rechaçada
Reis rejeitou o argumento de que a advogada agiu protegida pela decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 583.937/RJ, em 18 de dezembro de 2009. Com repercussão geral, o STF decidiu que “é lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro”.
Conforme o sentenciante, embora a gravação de conversa seja meio de prova lícita, não é moralmente legítima e viola o direito à intimidade, imagem e honra, “quando realizada por profissional da área jurídica no momento em que estava sendo atendida no fórum, no gabinete de magistrado, que tem direito à inviolabilidade e ao sigilo profissional”.
“A conduta descrita e analisada revela que os aborrecimentos experimentados pelo demandante não são meros transtornos rotineiros, merecendo a intervenção do Poder Judiciário. Isso porque os abalos gerados àquele pela gravação ambiental clandestina de conversa no seu ambiente de trabalho configuram ofensa à honra, surgindo o dever de indenizar moralmente”, concluiu Reis.
A sentença destacou que admitir a “conduta abominável” da requerida como regra ou exceção nas rotinas forenses, “vai aterrorizar a todos, criar embaraço à própria comunicação entre os profissionais do Direito e não contribuirá para a Justiça ou correta prestação jurisdicional”.
Em relação à indenização, Reis a fixou em R$ 10 mil por considerá-la dentro do critério da razoabilidade, levando-se em conta as condições da ofensora, do ofendido e do bem jurídico lesado. Para o julgador, esse valor é apto a satisfazer o caráter punitivo e compensatório da condenação por dano moral.
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