TJ-SP isenta dois promotores do Gaeco de indenizar advogado por dano moral
Por Eduardo Velozo Fuccia
O agente público que comete ato ilícito no exercício do cargo ou em razão dele é parte ilegítima em eventual ação cível, que deve ser ajuizada contra o Estado. Com esse fundamento, a 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu provimento ao recurso de apelação de dois promotores e reformou sentença que os condenou a indenizar em R$ 20 mil, por dano moral, um advogado criminalista.
“Aplica-se ao caso concreto o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, o que impõe o reconhecimento da ilegitimidade passiva dos apelantes, com a consequente extinção do feito, a teor do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, uma vez que a responsabilização decorreu de suas atuações como agentes públicos”, destacou o desembargador relator João Francisco Moreira Viegas.
O julgador baseou o seu voto no Tema 940, fixado pelo STF ao julgar o Recurso Extraordinário nº 1.027.633/SP, sob a sistemática da repercussão geral. Conforme esse tema, “a teor do disposto no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do ato, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
Os desembargadores Emerson Sumariva Júnior e Erickson Gavazza Marques seguiram o relator para dar provimento ao recurso dos promotores Cássio Roberto Conserino e Silvio de Cillo Leite Loubeh, bem como para negar acolhimento à apelação do advogado, que pleiteou a majoração da indenização para R$ 100 mil. O colegiado também rejeitou por unanimidade os embargos de declaração opostos pelo criminalista.
Conforme o acórdão, devido à extinção do processo, sem resolução do mérito, por carência da ação, os ônus da sucumbência devem ser atribuídos ao criminalista. Desse modo, caberá ao autor arcar com as despesas processuais, além dos honorários advocatícios, fixados em 15% do valor atualizado da causa. Inconformado com a decisão do TJ-SP, o criminalista interpôs recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Nas razões do recurso especial é sustentada violação ao artigo 505 do CPC, conforme o qual “nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide”. Segundo o arrazoado a ser ainda apreciado pelo STJ, a tese de ilegitimidade de partes acolhida no acórdão já havia sido objeto de decisão judicial, que reconheceu a legitimidade ativa dos promotores, “não podendo a referida matéria ser rediscutida em sede de apelação”.
Prisão e notícia
O criminalista expôs na inicial que que sofreu dano moral por ter o seu nome exposto na notícia intitulada “Operação do MP prende 13 policiais por envolvimento com o jogo ilegal na Baixada Santista”. A matéria foi postada no site do próprio Ministério Público de São Paulo, em 7 de agosto de 2012, mesma data das detenções. Além dos 13 policiais, o criminalista e quatro supostos operadores de jogos de azar foram presos.
Mandados de prisão e de busca e apreensão em endereços vinculados aos investigados foram deferidos pela Justiça a pedido dos promotores Cássio Roberto Conserino e Silvio de Cillo Leite Loubeh, do núcleo santista do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Horas após a captura, devido à falta de provas, foi solto o advogado, cujo apartamento e escritório chegaram a ser vistoriados.
No deferimento dos mandados, o juiz Reynaldo da Silva Ayrosa Neto advertiu por escrito nas próprias ordens sobre a necessidade de sigilo, “a fim de preservar não só as investigações, mas, enquanto não houver ação penal instaurada, também os direitos dos investigados”. A postagem no site do MP aconteceu enquanto a operação do Gaeco estava em andamento. A notícia original permaneceu na página do Ministério Público por 12 dias, quando foram suprimidos os nomes do criminalista e dos demais averiguados.
No despacho em que revogou as custódias cautelares dos 13 policiais detidos, um dia antes de expirar o prazo de cinco dias das suas prisões temporárias, Ayrosa observou que a notícia institucional prejudicou o interesse público nas investigações, porque diligências ainda estavam em curso. Posteriormente, os quatro acusados de operarem o esquema de jogos de azar também foram soltos pelo julgador.
Apenas o advogado processou os promotores por dano moral. A ação foi distribuída à 6ª Vara Cível de Santos e o juiz Joel Birello Mandelli anotou na sentença que “a regularidade da atividade investigativa impõe o maior respeito à lei e aos direitos dos investigados”. Quanto à legitimidade passiva dos requeridos, o magistrado citou o artigo 85 do CPP, segundo o qual “o órgão (membro) do MP será civilmente responsável quando, no exercício das suas funções, proceder com dolo ou fraude”.
“O dano moral experimentado pelo autor é flagrante e decorre não do pedido de prisão temporária feito pelos réus, representantes do MP, que é ato inerente às atividades do ofício, mas, sim, da desnecessária e ilegal exposição do nome do autor para a imprensa, o que certamente lhe causou lesão aos direitos de personalidade, sobretudo por se tratar de profissional liberal”, concluiu Mandelli.
Foto: Daniel Gaiciner
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