PF usa recurso usado pelo tráfico internacional para combatê-lo e prende cinco
Por Eduardo Velozo Fuccia
A organização criminosa ligada ao narcotráfico internacional desmantelada pela Operação Taeguk, da Polícia Federal, rastreava as drogas que despachava para o exterior. Porém, a partir desse mesmo recurso, foi possível às autoridades identificar diversos envolvidos no esquema. Na quinta-feira (7), cinco acusados foram capturados, sendo um em Santos e quatro em Guarujá. Apenas neste ano, conforme a PF, mais de uma tonelada de entorpecentes movimentada pelo grupo foi interceptada.
A derrocada da organização criminosa começou com a apreensão de 100 quilos de cocaína na caixa mar (sea chest) do navio M/V Hyundai Oakland, no Porto de Busan, na Coreia do Sul, em 15 de janeiro deste ano. Em tabletes da droga foram achados sete rastreadores AirTag. A Drug Enforcement Administration (DEA) – agência antidrogas dos Estados Unidos – apurou que os dispositivos foram adquiridos no Estados Unidos, porém, a instalação deles ocorreu no Brasil.
A DEA descobriu os IPs (números dos dispositivos conectados à internet) dos aparelhos que acessaram a conta Google vinculada aos AirTags ativados no Brasil. Essa informação foi compartilhada com a PF, que avançou nas investigações, identificando envolvidos no esquema e apurando outras ações da organização. Desse modo, igual ao ditado popular segundo o qual ‘o feitiço virou contra o feiticeiro’, o que o grupo usou para rastrear a droga para controlar toda a logística criminosa também serviu para a polícia rastreá-lo.
A principal característica do grupo é a introdução de cocaína na caixa mar de navios atracados em portos brasileiros, em especial no de Santos. Como esse compartimento é subaquático, a organização depende da atuação de um mergulhador profissional. Entre os presos na quinta-feira, um deles exerceria essa função. As tarefas dos demais consistiriam em fornecer a droga, transmitir informações privilegiadas sobre as rotas de navios e prestar vários tipos de apoio operacional na execução do crime.
Advogado na mira
Outros quatro acusados que tiveram a prisão preventiva decretada, sendo três de Guarujá e um de Bertioga, não foram localizados em suas respectivas casas e são considerados procurados da Justiça. Ainda há mais investigados que poderão ter ordens de captura expedidas contra si, a depender da evolução das investigações. Entre esses possíveis futuros alvos está um advogado, em cuja casa, por enquanto, foi apenas cumprido mandado de busca e apreensão.
Segundo a PF, esse investigado era o responsável direto pela compra de passagens aéreas de integrantes do grupo. Na maioria das vezes, elas eram adquiridas na mesma data do voo para dificultar eventual monitoramento por parte da polícia. Porém, no dia 11 de setembro, o advogado prestou um auxílio logístico mais importante, porque enviou 15 sacolas estanques e 200 balões infláveis até o Maranhão. Um dos acusados considerados foragidos retirou esse material no Aeroporto Internacional de São Luís.
Sacolas e balões são comumente utilizados para revestir e embalar drogas, garantindo o isolamento e evitando o seu contato com o ambiente líquido (sea chest) no qual elas foram inseridas nos navios. Na quinta-feira, a PF cumpriu mandado de busca e apreensão em uma marina na capital maranhense, onde apreendeu a lancha San Piter. Registrada em nome do suposto mergulhador preso em Guarujá, essa embarcação foi identificada pela Polícia Federal em algumas ações da organização.
Para cumprir os mandados de prisão e de busca e apreensão, a PF mobilizou cerca de 200 agentes federais e contou com o apoio de policiais militares. As ordens judiciais foram expedidas para endereços situados nos estados de São Paulo (Capital, Santos, Guarujá, São Vicente, Praia Grande, Bertioga, Caraguatatuba e Paraibuna), Rio de Janeiro (Duque de Caxias), Pará (Belém e Barcarena) e Maranhão (São Luís). Os capturados passaram por audiência de custódia e tiveram as suas prisões mantidas.
Sofisticação
O juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal Criminal de Santos, presidiu a audiência de custódia e não vislumbrou qualquer ilegalidade no cumprimento das ordens de captura, determinando a remoção dos presos ao Centro de Detenção Provisória de São Vicente. Ao decretar as preventivas dos acusados a pedido da PF, ele reconheceu que há, no mínimo, “fortes indícios de que os investigados se associaram de forma sofisticada e ordenada para a prática de tráfico internacional de entorpecentes”.
Conforme o julgador, a ameaça à ordem pública é manifesta, em razão da gravidade concreta dos delitos praticados. “A extensão dos relacionamentos das pessoas associadas do grupo é extremamente ampla, alcançando funcionários e seguranças do Porto de Santos”. Roberto Lemos também apontou a existência de suposto envolvimento de alguns dos acusados com outras facções criminosas, notadamente o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Após a apreensão dos 100 quilos de cocaína na Coreia do Sul, a organização criminosa foi vinculada a outros carregamentos de droga que foram descobertos pelas autoridades. São eles: cinco quilos de cocaína no navio Cosco Shipping Seine, no Porto de Shangai, na China; 400 quilos de maconha oriunda do Paraguai, em Bataguassu, no Mato Grosso do Sul; 289,3 quilos de cocaína no navio Trans África, em Las Palmas, na Espanha, depois da embarcação zarpar do Porto de Paranaguá (PR).
Também foram apreendidos 114,6 quilos de cocaína no navio Feng Huan Feng, em Santos; 124,6 quilos de cocaína no cargueiro Great Zhou, também em Santos, e 39 quilos de cocaína no navio Orchid, em Belém (PA). Entre 15 de janeiro a 13 de setembro de 2024 houve sete apreensões, totalizando 1.072,5 quilos de entorpecentes, sendo 672,5 quilos de cocaína e 400 quilos de maconha. A PF levantou que a organização programava mais duas remessas de cocaína ao exterior, a partir de Caucaia (CE) e São Luís (MA).
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