Abismo entre versões inocenta acusado de tráfico preso com cestas básicas
Por Eduardo Velozo Fuccia
O relato de dois policiais militares de que o réu portava uma sacola contendo dois tijolos de maconha pesando cerca de um quilo foi contestado por duas testemunhas. Segundo elas, na realidade, o acusado carregava cestas básicas para doação. Diante do abismo entre as versões, a juíza Denise Gomes Bezerra Mota, da 1ª Vara Criminal de Guarujá, decidiu pela absolvição por insuficiência de prova.
“A prova produzida nos autos se mostrou demasiadamente frágil, não permitindo um juízo de certeza quanto à autoria do réu no crime de tráfico de entorpecentes descrito na denúncia. As testemunhas ainda confirmaram que o acusado portava duas cestas básicas na ocasião dos fatos. Logo, restam abaladas as afirmações dos policiais em relação à conduta típica imputada ao réu”, sentenciou a juíza, no último dia 17.
As testemunhas foram indicadas pelo advogado Geraldo de Souza Sobrinho. Em suas alegações finais, ele destacou que elas “não têm quaisquer vínculos de amizade ou de ligação com réu, exceto pelo fato de frequentarem a mesma igreja e realizarem os trabalhos voluntários (de doação de cestas básicas)”. Enquanto o defensor sustentou a credibilidade destes depoimentos em oposição à versão dos PMs, o Ministério Público requereu a condenação por tráfico por considerar provadas a materialidade e a autoria.
Enredo contestado
O pizzaiolo A., de 23 anos, foi preso no dia 4 de dezembro de 2019, na favela do Caixão (foto principal), que fica em Vicente de Carvalho, Guarujá. Dois policiais das Rondas Ostensivas com o Apoio de Motocicletas (Rocam), do 21º BPM/I, disseram em juízo que o acusado e outro homem fugiram em uma moto ao vê-los. O réu ocupava a garupa e caiu no chão com a sacola quando o comparsa acelerou. O piloto escapou sem ser identificado.
Ainda conforme os PMs, o pizzaiolo correu até um bar, onde foi detido com a sacola contendo a maconha. Autuado em flagrante por tráfico, o acusado foi beneficiado no dia seguinte com a liberdade provisória. Em juízo, o réu negou ter tentado fugir de moto e a posse da maconha. Alegou que estava de folga, sendo designado pela igreja que frequenta a entregar cestas básicas na comunidade onde os policiais o prenderam.
O jovem disse que distribuía os alimentos a pé em uma viela quando oito PMs o abordaram e o levaram para o bar. Alguns policiais entraram com ele no comércio e o agrediram, enquanto os demais ficaram na parte externa. O pizzaiolo acredita que os agentes públicos imaginaram haver droga nas cestas básicas. Depois, surgiram com a sacola com o entorpecente e o mandaram assumir a propriedade.
Laudo de exame
Um dos policiais que depuseram na 1ª Vara Criminal de Guarujá declarou que havia mais pessoas no bar. Porém, nenhuma delas ou qualquer outra que eventualmente tenha presenciado a suposta fuga e a perseguição na favela foram qualificadas pelos PMs para serem oportunamente ouvidas. A defesa do réu, por sua vez, indicou como testemunhas dois voluntários que distribuíam cestas básicas. Ambos inocentaram o acusado.
Sobrinho argumentou que o laudo do exame de corpo de delito acusou lesões na face do cliente, “comprovando as agressões sofridas”, sem detectar escoriações nas pernas ou outros ferimentos compatíveis com queda de moto. Para o advogado, a impressão é a de que a prisão em flagrante do pizzaiolo “talvez tivesse sido para justificar as agressões sofridas pelo acusado constatadas no exame de corpo delito constante dos autos”.
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