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01/10/2021

Ausência de justa causa para ingresso de policiais em casa torna a prova ilícita

Por Eduardo Velozo Fuccia

Ainda que se trate de crime permanente, a ausência de justa causa para policiais ingressarem em uma casa, onde acharam uma pistola 9 milímetros desmuniciada e com a numeração raspada, torna ilícita a prova do delito de posse ilegal de arma. Isto vale até para a hipótese de o morador do imóvel assumir a propriedade do objeto. Com este entendimento, a 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu provimento ao recurso de apelação da defesa de um homem e o absolveu.

No último dia 24 de maio, o juiz Antônio Carlos C. P. Martins, da 2ª Vara Criminal de Praia Grande, condenou o apelante a quatro anos, dois meses e 12 dias de reclusão, em regime inicial fechado, por posse ilegal de arma de fogo. O magistrado reconheceu válida a conduta de policiais militares, segundo os quais eles receberam “denúncia anônima” de que o réu possuía armamento em casa, cujo acesso foi “autorizado” pela mulher dele.

O advogado Carlos Manuel Duarte Marques recorreu e pleiteou a absolvição do cliente por nulidade da prova, em razão da violação de domicílio. De acordo com ele, o juiz se equivocou na sentença ao reconhecer legalidade no ingresso do imóvel por parte dos PMs, sob a alegação de que a posse de arma é crime permanente, o que já caracterizaria o flagrante, dispensando-se ordem judicial ou autorização de morador.

“De fato, a ação dos policiais fundou-se em denúncia anônima que apontava a existência de um indivíduo armado. Entretanto, pelo que se constatou, os policiais dirigiram-se até aquele imóvel e não encontraram nenhum indício de situação de flagrante delito que autorizasse a invasão do domicílio, visto que o réu não ostentava a arma de fogo, bem como nada de ilícito foi encontrado consigo”, observou o desembargador Osni Pereira.

O advogado Carlos Manuel Duarte Marques teve a preliminar do seu recurso de apelação acolhida por unanimidade pelo TJ-SP

Relator da apelação, Pereira acrescentou que, embora não se exija um quadro de certeza, a presunção de flagrante deve vir lastreada por circunstâncias fáticas a lhe conferir justa causa. “Do contrário, qualquer situação meramente hipotética poderia justificar a restrição da garantia da inviolabilidade domiciliar, independentemente de ordem judicial”, concluiu. Os desembargadores Newton Neves e Otávio de Almeida Toledo acompanharam o seu voto.

Invocando a teoria dos frutos da árvore envenenada, conforme a qual as provas ilícitas contaminam as que dela derivam, o colegiado reconheceu “evidente vinculação” entre o encontro da arma de fogo e a violação do domicílio. “O ingresso ilícito contaminou toda a prova que se obteve a partir de então. Tratando-se de prova ilícita, a consequência é a sua imprestabilidade”, concluiu o acórdão, publicado na última quarta-feira (28).

Sob o fundamento de estar provado que o réu não concorreu para a infração penal, a 16ª Câmara de Direito Criminal acolheu a tese da defesa e absolveu o acusado. Ele havia sido preso em flagrante em 8 de janeiro deste ano, sendo solto após o término de audiência realizada no dia 6 de abril, mediante o compromisso de manter o endereço atualizado, comparecer aos atos processuais e não se envolver em outra infração penal.

Como o réu estava em liberdade por ocasião da sentença condenatória, o juiz permitiu que ele apelasse solto. O acusado foi abordado pelos PMs na frente de sua casa sem portar nada de ilícito, fato confirmado por testemunhas. Em juízo, a sua mulher negou ter autorizado a entrada dos policiais ao imóvel e os acusou de a obrigarem a sair da moradia enquanto a vistoriavam. O autuado disse que comprou a pistola para a segurança do lar.

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