Cocaína apreendida na Bélgica ‘tira o sono’ de várias pessoas no Brasil
Por Eduardo Velozo Fuccia
Ocultas no meio de cargas de ardósia e suco de laranja concentrado, 3,4 toneladas de cocaína foram interceptadas no porto belga de Ghent, em 2018 e 2019. Bombas de efeito retardado, as apreensões começam agora a tirar o sono de pessoas no Brasil, porque a droga cruzou o Atlântico e chegou à Europa em navios que zarparam do Porto de Santos. A Polícia Federal (PF) realiza devassa para apurar os envolvidos nas operações.
Em segredo de justiça, a PF em Londrina (PR) deflagrou investigação para identificar os participantes no esquema de tráfico internacional pelo complexo portuário santista. O crime de lavagem de dinheiro também é investigado, colocando várias pessoas jurídicas na berlinda. A pedido do delegado Roberto Biasoli, da PF, o juiz Nivaldo Brunoni, da 23ª Vara Federal de Curitiba, decretou no mês passado as prisões temporárias de 11 pessoas.
As investigações recaem sobre outros suspeitos. O juiz federal também deferiu pedido da PF para que os investigados tenham os sigilos bancários e fiscais quebrados. Por ocasião do cumprimento das ordens de captura, os acusados tiveram os seus endereços revistados com autorização judicial. Celulares, computadores, documentos e outros objetos de interesse das investigações foram apreendidos e são analisados pelos policiais.
Cocaína S/A
A PF batizou a investigação de Operação Tifeu. Ela é desdobramento da Operação Spectrum, também conduzida pela PF em Londrina, que apura “complexa organização criminosa” chefiada pelo megatraficante Luiz Carlos da Rocha, o Cabeça Branca. Considerado “embaixador do tráfico”, com o nome inserido nos arquivos da Interpol e procurado havia 13 anos, Cabeça Branca foi preso pela PF em 2017, em Sorriso (MT).
Na Spectrum, apurou-se que a organização negociou cerca de 26 toneladas de cocaína entre 2014 e 2017, movimentando US$ 138 milhões (cerca de R$ 750 milhões). Na Tifeu, são investigadas duas remessas de cocaína para a Europa, a partir do Porto de Santos. Em agosto de 2018, houve apreensão de 1.930 quilos da droga no porto belga de Ghent. O entorpecente estava em uma carga de ardósia.
Em março de 2019, também em Ghent, foi achada mais 1,5 tonelada de cocaína em um carregamento de suco de laranja. Dias após, uma analista de importação e exportação de um terminal portuário santista, pelo qual passou o suco de laranja, viajou para a Bélgica para supostamente se encontrar com um dos alvos da Tifeu. Ela é mulher do sócio de duas empresas que atuam nos ramos de logística e de comércio exterior.
A PF investiga o casal. Ele não está na relação de presos, mas teve os sigilos bancário e fiscal levantados. A quebra desses dados se estendeu às empresas do marido da analista de importação e exportação do terminal do Porto de Santos. Com autorização judicial, a PF também revistou os endereços vinculados ao casal e averigua se ele sabia ou não da cocaína escondida no carregamento de suco de laranja.
Empresário solto
Um empresário argentino e um escrevente de cartório são alguns dos presos da Tifeu. O primeiro teve a temporária de 30 dias decretada, mas foi solto antes desse prazo, após depor. O advogado Marcelo Cruz exibiu à PF documentos contábeis das 12 empresas do estrangeiro antes do depoimento. “Demonstramos que as movimentações financeiras do cliente são compatíveis com o faturamento das pessoas jurídicas”, afirmou.
Por supostamente informar um dos alvos da Tifeu sobre a operação da PF, o escrevente passou a ser investigado. Ele ficou preso temporariamente por cinco dias e o delegado Biasoli considerou desnecessário mantê-lo encarcerado por mais tempo. O funcionário do cartório, localizado na Baixada Santista, disse que não teve a intenção de alertar ninguém. No entanto, afirmou estar “arrependido e envergonhado” pelo que fez.