Espanha suspende extradição de brasileiro acusado de tráfico internacional
Por Eduardo Velozo Fuccia
Após pouco mais de um ano preso na Espanha, em razão de processo por tráfico internacional de drogas que responde na 5ª Vara Federal de Santos, o empresário brasileiro Eduardo de Oliveira Cardoso, de 44 anos, retornaria ao território pátrio. O Conselho de Ministros do governo espanhol atendeu a pedido do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) brasileiro para extraditar o réu. Porém, na véspera da viagem de volta, marcada para o último dia 16, a extradição foi suspensa por meio de liminar.
“A autoridade judiciária ordenou a suspensão temporária da entrega. É por isso que somos forçados a cancelar a operação para esta finalidade preparada”, diz “Certificado de Suspensão de Entrega” emitido pela Interpol. O documento foi exibido no Aeroporto Adolfo Suarez Madrid-Barajas a policiais federais que foram buscar o réu na Espanha.
O certificado não informa por qual motivo a extradição foi suspensa. Independentemente da razão, a decisão frustrou as autoridades policiais e judiciárias brasileiras. Segundo informação extraoficial, o empresário brasileiro teria requerido “asilo” ao Governo da Espanha. O Vade News tentou contato com a defesa de Eduardo, mas não obteve retorno.
O novo endereço provisório do réu no Brasil seria a Penitenciária Dr. Geraldo de Andrade Vieira, a P-I de São Vicente, no litoral de São Paulo. Preso na capital espanhola no dia 22 de outubro de 2019, Eduardo continuará recolhido no Centro Penitenciário Madri V, na cidade de Soto del Real, que abriga uma população carcerária considerada vip.
O brasileiro participava de uma feira da indústria alimentícia quando foi capturado. A BRK Internacional, empresa do réu, tinha um estande no evento. Empresário bem-sucedido aos olhos de muitos, Eduardo começou a ter exposta a suposta razão de sua prosperidade nos negócios quando policiais espanhóis cumpriram o seu mandado de prisão, inserido na difusão vermelha (lista de procurados da Interpol).
O Conselho de Ministros, que concordou com a extradição de Eduardo, é um órgão político-constitucional presidido pelo governo espanhol. Atualmente, o primeiro-ministro Pedro Sánchez é quem comanda o colegiado, cuja decisão foi informada à Embaixada do Brasil em Madri pelo Ministério de Assuntos Exteriores, União Europeia e Cooperação.
Ação adiantada
O juiz federal Roberto Lemos dos Santos Filho remeteu às autoridades espanholas carta de cooperação jurídica internacional, via MJSP, e interrogou o réu no último dia 1º de setembro por meio de videoconferência. Pelo mesmo sistema, testemunhas que estão na Espanha também depuseram na ação penal. O magistrado aguarda da Justiça daquele país o envio das mídias das audiências virtuais.
A expectativa é a de que Eduardo seja sentenciado no primeiro trimestre de 2021. Ao receber denúncia do Ministério Público Federal (MPF), o juiz citou “fortes indícios” da participação de Eduardo em “organização criminosa de elevado poder financeiro”, com atuação em mais de um estado, voltada à prática de diversos delitos, como lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, além de “intenso tráfico transfronteiriço” de drogas.
Casal Busca-pó
A Polícia Federal (PF) desmantelou a organização criminosa da qual o empresário faria parte na Operação Alba Vírus (do latim, veneno branco, em referência à cocaína). A investigação gerou cinco ações penais. Uma delas já foi sentenciada e resultou na condenação de Karine de Oliveira Campos, a 17 anos e dois meses de reclusão, e do seu companheiro, Marcelo Mendes Ferreira, a 15 anos, dois meses e dez dias.
Karine e Marcelo formam o Casal Busca-pó. Apontados como os líderes da organização criminosa, eles permanecem foragidos. Por meio da empresa de Eduardo Cardoso, a quadrilha enviaria 1,4 tonelada de cocaína de navio do Porto de Santos para a Europa. A droga estava escondida em uma carga de frango congelado e foi descoberta ainda em solo brasileiro em julho do ano passado, conforme denúncia do MPF.
O empresário também aparece em um vídeo no qual acompanha a introdução de outro lote da droga em um carregamento de frango a ser despachado ao exterior pelo Porto de Paranaguá (PR). A filmagem ocorreu no final de 2018 e foi feita em um galpão na Grande São Paulo. O MPF atribuiu ao grupo sete “eventos” – nome de cada operação de tráfico internacional descoberta pela PF.
Na principal delas, em duas casas situadas em Guarujá (SP), nos dias 20 e 21 de fevereiro de 2019, havia 1.343 quilos de cocaína, um fuzil, cinco pistolas, 21 celulares, documentos, R$ 1.020.650,00 e materiais para preparar e embalar drogas. Os telefones armazenavam vídeos mostrando alguns réus participando da ocultação da droga em cargas lícitas a serem embarcadas em navios.
Segundo a PF, a filmagem era feita para servir de “prova” aos líderes da organização e importadores do entorpecente de que o esquema foi executado conforme o planejado. Os vídeos possibilitaram identificar integrantes da organização criminosa e desvendaram outras seis transações, até então, ignoradas. A cocaína foi escondida em cargas de madeira, ardósia, frango congelado e amianto.
Dos portos de Santos, Paranaguá (PR) e Navegantes (SC), navios zarparam para Antuérpia (Bélgica), África do Sul e Valência (Espanha), levando cerca de seis toneladas de cocaína. A organização criminosa também utilizou portos do Nordeste, em especial o de Salvador. Há uma década, o casal Busca-pó foi preso por tráfico na Bahia, mas só ficou seis meses na cadeia.