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02/12/2022

Gestor de OS é condenado por entrega de aparelhos sem registro na Anvisa

Por Eduardo Velozo Fuccia

Acusado de crime contra a saúde pública, por disponibilizar a uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Guarujá 11 ventiladores mecânicos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o administrador de uma organização social (OS) foi condenado na modalidade culposa (não intencional) do delito a duas penas restritivas de direito. Para o Ministério Público Federal (MPF), que deverá recorrer da decisão, o réu agiu com dolo. Os aparelhos se destinavam a pacientes de covid-19.

“As provas colhidas não são suficientes para demonstrar que o acusado possuía a percepção de que seu comportamento era contrário ao direito. Não obstante, ao meu sentir, elas são mais do que suficientes para demonstrar que, independentemente de ter pretendido o resultado obtido, este ocorreu por negligência do réu”. A observação é do juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal de Santos, ao afastar o dolo, mas reconhecer a culpa do denunciado.

Com essa justificativa, o julgador aplicou na sentença o instituto da emendatio libelli, previsto no artigo 383 do Código de Processo Penal, que permite atribuir ao fato descrito na denúncia definição jurídica diversa. Conforme o magistrado, as circunstâncias evidenciam “omissão no emprego da cautela e atenção necessárias durante a aquisição dos equipamentos médicos, objeto de apuração nestes autos, os quais, vale registrar, se destinavam a integrar leitos de unidades de tratamento intensivo”.

Almir Matias da Silva, gestor da OS Pró-Vida, é cantor sertanejo e foi condenado a duas penas restritivas de direito

O crime culposo é punível com um a três anos de detenção. O juiz fixou a pena em dois anos e quatro meses, quase no patamar máximo, em regime aberto. Na dosimetria, ele considerou que a conduta merece maior reprovação, “diante da gravidade dos fatos”, porque os ventiladores mecânicos adquiridos pela OS com recursos públicos (R$ 912 mil) se destinavam a leitos de UTI. Também foi reconhecida a agravante do artigo 61, inciso II, alínea “j”, do Código Penal (ação praticada durante calamidade pública).

Por fazer jus à benesse do artigo 44 do CP, o réu teve a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direito: prestação de serviços comunitário ou a entidades filantrópicas e prestação pecuniária de 50 salários mínimos (R$ 60,6 mil), a ser paga em prol de instituição pública ou privada, com destinação a ser estabelecida conforme a Resolução 154/2012 do Conselho Nacional de Justiça. Diante da sentença, foi expedido alvará para o acusado ser solto, salvo se não estiver preso por outro motivo.

Verbas públicas

Acusado de supostos desvios milionários de verbas federais da saúde por meio de várias organizações sociais, o réu teve a prisão preventiva decretada e foi preso no dia 31 de agosto deste ano. No entanto, na sentença que o condenou por crime contra a saúde pública na última quarta-feira (30/11), o MPF restringiu a denúncia ao fato de os ventiladores mecânicos, sem o registro exigível pelo órgão de fiscalização, serem entregues ao uso da população entre 16 de julho de 2020 e 9 de março de 2021.

Conforme a denúncia, o empresário e cantor sertanejo Almir Matias da Silva, na qualidade de gestor da Organização Social Pró-Vida, destinou os equipamentos à UPA Dr. Matheus Santamaria. Porém, resolução da Anvisa editada em 26 de junho de 2020 já havia determinado a suspensão, a comercialização, a fabricação e o uso dos ventiladores pulmonares do modelo BR 2000, da empresa Bioex, por falta de registro no órgão competente.

A irregularidade veio à tona a partir de comunicação feita pela Prefeitura de Guarujá à Polícia Civil. De acordo com o MPF, o Poder Público municipal interveio no contrato de gestão celebrado com a Pró-Vida, porque vistoria realizada pela Secretaria de Saúde detectou falhas funcionais nos aparelhos adquiridos com recursos públicos, além da falta de registro na Anvisa. A OS foi contratada emergencialmente pelo município, portanto, sem licitação, no âmbito do enfrentamento da pandemia do novo coronavírus.

A defesa do réu requereu a sua absolvição por atipicidade. Ela argumentou que os respiradores não chegaram a ser disponibilizados para o uso de pacientes, não causando qualquer lesão ou risco de lesão à saúde pública. Sustentou também ausência de dolo e atribuiu a responsabilidade pela cotação e aquisição dos equipamentos ao setor de compras da Pró-Vida. Por fim, na hipótese de condenação, pediu a desclassificação para a modalidade culposa.

O juiz Roberto Lemos rejeitou a tese de atipicidade, porque o crime em questão é de perigo presumido, sendo prescindível a comprovação de risco efetivo à saúde pública e bastando a importação, venda, distribuição ou entrega para consumo do produto sem registro. Quanto a alegação do réu de que não foi o responsável pela compra dos ventiladores mecânicos, o julgador destacou que, na condição de administrador, competia ao denunciado exercer todos os atos pertinentes à gestão da organização social.

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