Justiça Federal autoriza mulher importar semente de maconha para fim medicinal
Por Eduardo Velozo Fuccia
Uma servidora pública poderá importar sementes de maconha sem correr os riscos de tê-las apreendidas pelas autoridades policiais e ser processada por tráfico de drogas. A autorização decorre de habeas corpus preventivo concedido pela juíza federal Renata Andrade Lotufo, da 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo, em razão da finalidade medicinal alegada e do princípio constitucional da isonomia.
A mulher pretende cultivar em sua moradia as sementes de cannabis sativa para produzir o próprio óleo de cânhamo. Ele é indicado para combater os sintomas da síndrome parkinsoniana, bem como os efeitos colaterais causados pelos medicamentos tradicionais. Em 2014, a servidora pública foi diagnosticada com essa doença, que a obrigou a se afastar do trabalho.
O tema carece de jurisprudência pacífica nos tribunais federais e a juíza Renata Lotufo, em sua decisão, cita trecho de um voto do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), segundo o qual “a criminalização estigmatiza o usuário e compromete medidas de prevenção e redução de danos”.
“Desse extenso resumo sobre as oscilações rítmicas da jurisprudência sobre as sementes da maconha e a questão do uso próprio, extraem-se as seguintes conclusões: o direito e a sociedade estão amadurecendo sobre o uso próprio de drogas; a jurisprudência é absolutamente insegura em relação ao assunto, caso a impetrante resolva arriscar importar por conta e risco as sementes de maconha”, constata a juíza federal.
Por outro lado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), acolhendo vários estudos e testes sobre a eficácia do uso do canabidiol para fins terapêuticos, incluiu recentemente a cannabis sativa em seu rol de plantas medicinais, de uso controlado. No entanto, o órgão não permite a produção do óleo de cânhamo no Brasil, autorizando apenas a sua importação, que tem custo elevadíssimo, inacessível à servidora.
Ao conceder o habeas corpus preventivo, a juíza diz que, como só é possível a obtenção do óleo via importação, o tratamento fica restrito a um pequeno público, ferindo o direito constitucional da isonomia e que a medida (possibilidade de importação) trouxe pouco alento para aqueles que não sejam de família de classe média alta ou alta.
O cultivo e a produção caseira do óleo medicinal da maconha, já liberado em outros países, é uma realidade no mercado paralelo brasileiro. Na internet estão disponíveis vídeos com tutoriais ensinando a fazer o óleo. “Assim, é totalmente admissível, tolerável e compreensível o desespero das famílias que produzem seu próprio óleo medicinal, já que mal de Parkinson, esclerose múltipla são doenças com sintomas que trazem bastante sofrimento aos pacientes e suas famílias”, destaca Renata Lotufo.
O derradeiro fundamento da decisão da magistrada é a inexistência de indícios de que a servidora irá cometer quaisquer delitos relacionados ao uso indevido ou ao tráfico de entorpecentes, “haja vista que busca somente melhores condições de vida no convívio de sua enfermidade, a qual não possui cura até a presente data”.