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14/03/2020

Naufraga apuração de esquema de corrupção no uso de ilha em área de proteção

Por Eduardo Velozo Fuccia

A Teoria dos frutos da árvore envenenada fundamentou decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para anular a interceptação telefônica e as provas dela derivadas em ação penal que apura esquema de corrupção na aprovação de complexo portuário na Ilha dos Bagres, em Santos. A Polícia Federal batizou o caso de Operação Porto Seguro.

A declaração de nulidade decorreu de pedido do advogado José Luiz Moreira Macedo (foto), devido à falta de “fundamentação concreta” na interceptação telefônica do cliente. O ministro Nefi Cordeiro, da Sexta Turma do STJ, deferiu o requerimento, “sem prejuízo do prosseguimento da ação penal com base em outras provas”.

Macedo invocou o Artigo 157 e seu parágrafo único do Código de Processo Penal. Eles traduzem a Teoria dos frutos da árvore envenenada: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas”.

Embora o STJ tenha decidido com base no pedido do advogado de um dos réus, a decisão alcança os demais. Em 14 de dezembro de 2012, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou 24 pessoas pelos delitos de associação criminosa, corrupção ativa e passiva, tráfico de influência, falsidade ideológica e falsificação de documento particular.

Entre os réus estão Paulo Rodrigues Vieira, na época diretor de Hidrologia da Agência Nacional das Águas (ANA); o ex-advogado-geral-adjunto da União, José Weber Holanda; Rosemary Nóvoa de Noronha, que chefiava o Gabinete Regional da Presidência da República em São Paulo, e o ex-senador Gilberto Miranda Batista (MDB-AM).

Rosemary ficou conhecida mais pela sua ligação com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva do que pelo cargo. Junto com Vieira, Holanda e Miranda, segundo a denúncia, ela faria parte da cúpula da quadrilha que tinha como “principal atividade e meio de vida o trabalho de intermediação dos interesses particulares de grandes empresários”.

Em contrapartida, ainda conforme o MPF, os beneficiados pagavam vultosas propinas aos réus. Os cabeças se valiam inclusive de tráfico de influência para nomear comparsas em cargos de diretoria em agências reguladoras. Tais indicações tinham por objetivo viabilizar interesses privados em detrimento do público.

No caso da Ilha dos Bagres, área de proteção permanente ao lado do Porto de Santos, a PF apurou a existência de corrupção na aprovação de projeto de complexo portuário de R$ 2 bilhões. O terminal ocuparia 1,2 milhão de m², tamanho similar ao do Parque do Ibirapuera, na Capital.

Antes do oferecimento da denúncia, o projeto não vingou, mas ele chegou a receber a aprovação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), da Secretaria dos Portos e da Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Agora, com a decisão do STJ, é provável que a Porto Seguro naufrague e também não vingue.

Inegável reconhecer que foi aberto caminho para provável absolvição dos investigados pela insuficiência probatória. Decorridos quase oito anos do ajuizamento da ação, produzir novas provas para substituir as eliminadas não será tarefa fácil ao Ministério Público Federal. Quem acusa deve provar. Havendo dúvida, impõe-se a absolvição.

Habeas corpus impetrado pelo advogado José Luiz Moreira Macedo favoreceu o cliente e os demais réus

Prorrogações sucessivas

O processo tramita na 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo. O advogado José Luiz Macedo impetrou habeas corpus sob o argumento de ausência de fundamentação concreta na decretação da interceptação telefônica e porque a “medida invasiva” perdurou por mais de um ano, havendo excesso no número de prorrogações de prazo.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) negou o habeas corpus, justificando que a interceptação foi legal, porque teve fundamentação idônea. Em relação às prorrogações, alegou que elas foram necessárias devido à complexidade do caso, ao grande número de envolvidos e à imprescindibilidade da medida para elucidar os crimes.

O advogado recorreu ao STJ. Inicialmente, Nefi Cordeiro negou o recurso em habeas corpus e Macedo ofereceu agravo. Na reanálise da matéria, o ministro reconheceu, no último dia 9, a “ilicitude” das provas produzidas, porque a interceptação telefônica “carece de fundamentação válida” e decorreu de “genérico decreto”.

José Luiz Macedo destacou o trabalho de equipe em sua atuação na Operação Porto Seguro. Nos mais diversos estudos e providências que a causa requer, ele conta com a participação dos colegas Luiz Antonio Mazagão e Fábio Couto, do escritório Mazagão & Macedo Advogados Associados.

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