Tenente do Exército que matou marido deve responder por atentado a enteada
Por Eduardo Velozo Fuccia
“Não foram disparos técnicos. Entendo que a criança correu efetivo risco de ser atingida e, por isso, ela deve ser considerada vítima de tentativa de homicídio”. A declaração do advogado Alexsandro da Silva Martori se refere à filha de 11 anos do empresário morto a tiros pela esposa, que é dentista e tenente do Exército. Presa em flagrante, a militar foi solta dias depois, beneficiada com liberdade provisória.
O crime ocorreu em frente à residência onde o casal residia, em Praia Grande, no litoral de São Paulo, às 18h27 de 3 de dezembro de 2021, conforme o registro de câmera de segurança. Bruno Piva Júnior, de 52 anos, foi baleado no pescoço e o projétil se alojou na região torácica. Outro disparo o feriu na mão. Ele morreu na última terça-feira (25), após ficar 53 dias internado na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Irmã Dulce.
Filmagem juntada ao inquérito policial mostra a menina dentro do carro do pai e demonstra que ela também foi vítima, conforme sustenta Martori, que representa a família de Bruno. Armada com uma pistola calibre 7.65, a tenente Karina de Freitas Fogolin, de 41 anos, se encontra no banco do motorista do veículo (vídeo 1). Bruno chega pela calçada e tenta retirá-la do automóvel ou desarmá-la, mas sem sucesso.
Segundo o advogado, neste embate, a menina já correu risco de um eventual disparo, intencional ou acidental. Em outro momento da gravação (vídeo 2), a menina já saiu do carro e está agachada ao lado dele na calçada. Mais distante do veículo, o empresário fala ao celular. A tenente, então, também deixa o automóvel e vai em direção ao marido. Bruno continua o telefonema e evita discutir com a mulher, afastando-se.
Nas próximas cenas do vídeo, Karina olha para a pistola que segura e simula que entrará na casa. Porém, quando o portão eletrônico começa a se fechar, ela retorna, coloca apenas a perna direita na calçada, dispara duas vezes em um intervalo de três segundos e volta ao imóvel antes de o portão completar o fechamento. Minutos depois, com a chegada de policiais militares, ela alegou que o casal fora vítima de tentativa de assalto.
Diante do relato de testemunhas e da filmagem, a versão não durou por muito tempo. Ela, então, passou a admitir os tiros sob a alegação de sofrer constantes agressões físicas do marido e recebeu voz de prisão. No entanto, ao ser questionada o porquê de nunca ter registrado boletim de ocorrência contra o marido, ele afirmou nutrir a esperança de que o marido pudesse melhorar.
Opinião delitiva
Martori pediu a inclusão da filha do empresário, fruto de um relacionamento anterior, como vítima, porque entende que ela correu risco de ser baleada quando estava dentro do carro e, principalmente, fora dele, no momento dos disparos. “A acusada teria disparado sem se importar se a criança estava ou não na linha de fogo”. Para o advogado, no mínimo, a tenente assumiu o risco de atingir a enteada.
A promotora Mariana da Fonseca Piccinini se manifestou contra o pedido de inclusão da menina como vítima, “pois diz respeito a atribuição da autoridade policial, no tocante à investigação, bem como atribuição privativa do Ministério Público, titular da ação penal, na formação da opinião delitiva”. Para ela, ainda faltam elementos, como laudos, essenciais à adequada elucidação dos fatos.
Antes do falecimento do empresário, a representante do MP opinou pela prisão preventiva da acusada, em razão da gravidade do delito, bem como para garantir a ordem pública e pela conveniência da instrução criminal. A promotora também se manifestou contra o pedido de prisão domiciliar que a defesa da tenente fez sob a justificativa de a mulher ser mãe de duas crianças, de 7 e 13 anos. Os filhos são de outro relacionamento.
O artigo 318-A do Código de Processo Penal prevê a prisão domiciliar para mães de filhos com até 12 anos incompletos, porém, o crime não pode ter sido cometido com violência ou grave ameaça a pessoa. A juíza Natalia Cristina Torres Antonio, da Vara do Júri de Praia Grande, acolheu o parecer do MP no sentido de não incluir a filha do empresário como vítima e de indeferir o pedido da defesa de Karina de prisão domiciliar.
Porém, a magistrada deferiu o requerimento defensivo de revogação da prisão, por considerar ausentes os requisitos da preventiva e ser a acusada primária, além de possuir ocupação lícita e residência fixa. Como contrapartida, a juíza impôs as seguintes medidas cautelares, entre outras: recolhimento domiciliar no período noturno, proibição de se mudar de endereço sem prévia autorização judicial e não praticar novos crimes.
Karina foi autuada em flagrante por tentativa de homicídio simples. Com a morte de Bruno, o crime se tornou consumado (pena de 6 a 12 anos de reclusão). Por não estar vinculada à capitulação jurídica adotada pelo delegado de polícia, a promotora pode conferir outra tipificação à conduta da acusada, por exemplo, homicídio qualificado (punível com 12 a 30 anos de reclusão), por ocasião do oferecimento da denúncia.
Missa de 7º dia
A missa de 7º dia de Bruno Piva Júnior será celebrada nesta segunda-feira (31), às 19 horas, na Paróquia Santíssima Virgem, em São Bernardo do Campo. Nesta cidade da região do ABC, o corpo de Bruno foi sepultado na quarta-feira passada (26), no Cemitério Jardim da Colina. A filha da vítima está sob os cuidados da avó materna. A mãe da menina é falecida.
*Curta https://www.facebook.com/portalvadenews e saiba de novos conteúdos