Vereador vira réu por racismo após comportamento homofóbico durante sessão
Por Eduardo Velozo Fuccia
Um vereador da Câmara de Bertioga (SP), no litoral de São Paulo, virou réu pelo crime de racismo, sob o aspecto da homofobia. Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), na condição de segundo secretário da casa, o parlamentar se recusou a ler projeto de lei de autoria de uma colega, voltado à promoção da cidadania de pessoas LGBTQIA+ no município, manifestando preconceito e proferindo discurso de ódio contra esse grupo.
Por reconhecer “indícios suficientes de autoria e materialidade”, o juiz Daniel Leite Seiffert Simões, da 1ª Vara da Comarca de Bertioga, recebeu a inicial acusatória na quinta-feira (27), véspera do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. A fala do vereador Eduardo Pereira de Abreu (PSD) ocorreu na frente de várias pessoas, em 21 de maio, e consta da filmagem integral da sessão, realizada pela TV Câmara.
Além da condenação do réu por racismo, descrito no caput do artigo 20 da Lei 7.716/1989, a promotora Joicy Fernandes Romano pediu o aumento de pena previsto no artigo 20-B, por envolver funcionário público no exercício da função. Nessas condições, a sanção varia de um ano e quatro meses a quatro anos e seis meses de reclusão. A representante do MP também quer que seja paga indenização mínima de R$ 50 mil.
O pedido indenizatório está amparado no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. Essa regra permite ao juiz, na sentença criminal, fixar valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração. Segundo a promotora, a conduta do acusado gerou danos morais coletivos e o valor pleiteado se destinaria a fundos ou ações voltados ao enfrentamento à discriminação e à promoção da igualdade da população LGBTQIA+.
A denúncia por racismo tem por base a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26/DF. Nela, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, traduzem expressões de racismo e ajustam-se aos preceitos primários na Lei 7.716/1989.
Sem acordo
Joicy Romano descartou na inicial eventual futura alegação do denunciado de que apenas teria feito uso de sua “liberdade de expressão”, porque esta “não abarca o discurso de ódio”. Ela também afastou a possibilidade de propor ao acusado acordo de não persecução penal (ANPP), “por se tratar de benefício desproporcional e incompatível com infração penal violadora de valores sociais e direitos humanos”.
Com o recebimento da denúncia, o juiz determinou que o réu seja citado para apresentar resposta escrita à acusação, por meio de advogado, no prazo de dez dias. O Vade News entrou em contato com o vereador, mas ele preferiu não se manifestar. O site da Câmara de Bertioga informa que Eduardo Pereira é evangélico, engenheiro civil, bacharel em Direito e casado. Ele exerce o seu terceiro mandato na casa legislativa.
“Vou sair fora”
De autoria da vereadora Renata da Silva Barreiro (PSDB), o Projeto de Lei nº 35/2023 prevê a instituição do programa ‘Respeito Tem Nome’, voltado à promoção da cidadania de pessoas LGBTQIA+. Entre as ações previstas, ele visa garantir o direito ao uso do nome social nos órgãos públicos municipais e ofertar um programa para auxiliar os interessados em retificar o prenome e o gênero nos documentos oficiais.
Por ocasião da leitura do PL 35/2023 no plenário da Câmara para sua devida discussão e votação, Eduardo Pereira se recusou, embora tivesse lido outros na mesma sessão. “Ah, não Renata, vou sair fora”. (…) Tá louco, não faz isso comigo não! Dar um projeto LGBT pra mim ler, não, tó, pega aí (sic)”, disse ele. Em seguida, ele se retirou do recinto, retornando dez minutos depois.
Indagada por alguém que acompanhava a sessão sobre o que estava acontecendo, Renata ironizou: “Também não estou entendendo. Quando entender, eu explodo!”. Para a promotora, “ao manifestar publicamente sua aversão à população LGBTQIA+, recusando-se ao exercício de sua função, o denunciado incitou a discriminação e estimulou a hostilidade contra esse grupo, praticando discriminação penalmente típica”.
Imagens: TV Câmara
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