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10/07/2017

Feminicídio: Mais uma lei simbólica! Os agressores não temem a lei!

A advogada e professora universitária Renata Soares Bonavides escreveu o livro “Crimes Passionais ou Amor Patológico?”

Por Renata Soares Bonavides (*)

A violência contra a mulher cada vez é mais exacerbada. Todos os dias mulheres são atacadas física e psicologicamente, muitas brutalmente levadas à morte, por homens com que mantêm ou mantiveram relacionamentos amorosos. Segundo o Instituto Avante Brasil, uma mulher morre a cada hora em nosso país.

Necessitou a lei penal brasileira criar uma nova qualificadora ao crime de homicídio a fim de contemplar maior proteção à mulher, antes vítima de homicídio quando levada à morte, como todo e qualquer ser humano. A inserção da nova qualificadora foi a solução? Infelizmente, não!

A nítida opressão enfrentada pelas mulheres no convívio com alguém do sexo masculino é inegável. Culturalmente, em vários países a mulher é inferiorizada em inúmeros aspectos e no Brasil, lamentavelmente, a realidade não é diferente. A Constituição Federal brasileira afirma que todos são iguais perante a lei, mas essa assertiva não é realidade! A violência física e psicológica, dentre outras, assacadas contra as mulheres, remonta de longa data!

 

Não bastou a lei batizada como Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) para frear a descabida e desenfreada violência contra a mulher. Não bastam as medidas protetivas previstas nesta lei, que de protetivas não têm nada, porque não há como controlar o agressor. Quantas mulheres munidas de medidas protetivas são executadas todos os dias? O Estado não garante com a necessária eficiência muitas medidas protetivas concedidas pelo Poder Judiciário, a exemplo da medida que proíbe o agressor de se aproximar da vítima, pois até que a polícia seja acionada, o agressor já agiu mais rápido, ferindo ou matando a mulher.

O feminicídio chegou ao ordenamento jurídico brasileiro em março de 2015, com o advento da Lei 13.104/15, como uma continuidade da tutela especial que se pretende dar às mulheres, considerando homicídio qualificado e hediondo a conduta de matar a mulher, valendo-se de sua condição de sexo feminino.

Foi acrescentada à lei penal não incriminadora a explicação do termo “razões da condição de sexo feminino”, esclarecendo que ocorrerá em duas hipóteses: 1ª) violência doméstica e familiar; 2ª) em razão de menosprezo ou discriminação à condição de mulher. E, ainda, acrescentou causas de aumento de pena de um terço até a metade para o crime de feminicídio quando praticado durante a gravidez ou nos três meses posteriores ao parto; contra pessoa menor de 14 anos, maior de 60 anos ou com deficiência, e quando na presença de ascendente ou descendente da vítima.

Guilherme de Souza Nucci (2017, p. 46) pontua que “o agente não mata a mulher somente porque ela é mulher, mas o faz por ódio, raiva, ciúme, disputa familiar, prazer, sadismo, enfim, motivos variados, que podem ser torpes ou fúteis. Não é descartada a possibilidade de o homem matar a mulher por questões de misoginia ou violência doméstica”, que proporcionam aos homens o prazer diabólico de espancar e matar uma mulher.

O homem mata a mulher por covardia, pelo desejo de estar sempre no comando, e quando não mais está neste comando ou na “propriedade” da mulher, arrebenta todos os laços que tenham sido um dia de afeto, proteção, carinho e promessa de amor para uma vida inteira.

Cleber Masson (2016, p. 47-49) com muita propriedade pontua que a qualificadora inserida na lei penal que trata do feminicídio é constitucional e necessária. Assevera: “o critério da discriminação é objetivo e positivo: repousa na necessidade de maior proteção nos crimes cometidos contra a mulher por razões de gênero, especialmente nas sociedades ainda contaminadas pelos impulsos machistas. Com o merecido respeito, não podemos nos basear em discussões meramente teóricas e filosóficas, em descompasso com a realidade fática, na qual milhares de mulheres são tratadas como objetos masculinos em um mundo pontuado pela crueldade. Qualquer pessoa, independentemente do sexo, deve ter o direito de viver a própria vida, e de um dia, quando chegar a hora, morrer a própria morte”.

Todos os dias somos dolorosamente tomados por notícias de crimes bárbaros assacados contra inúmeras mulheres. No dia 5 de julho deste ano, a imprensa santista noticiou mais um ataque brutal contra uma mulher, vitimada pelo ex-marido, que cortou seu pescoço com um estilete em razão da separação. Por sorte, sobrevivera.

É inegável que nada adianta o rigor da lei. Esta não inibe, não intimida, não retrai quem pretende delinquir. Faz-se necessária a mudança cultural em nossa sociedade, ainda machista como outrora. Os homens não aceitam o abandono, a traição, a rejeição. E muitos matam por isso. A grande maioria tem certeza que é um ser superior em relação à mulher em todos os sentidos.

Fica o alerta! Que nós mulheres não nos submetamos a nenhum tipo de agressão, opressão, sofrimento, esforço que nos avilte, submissão e nem ao silêncio! Que não renunciemos ao direito natural, que é o direito ao amor, que nada exige em troca, que não machuca, não fere, não agride, não cobra, não cerceia! Quem ama não mata! Quem ama dá tudo de melhor de sua essência, zela, cuida, protege, defende, é feliz ao ver a felicidade do outro! Por isso, ame e seja amado! Seja feliz!

 

(*) Graduada em Direito pela Universidade Católica de Santos (UniSantos). Mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos (Unimes) e doutora em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo. Advogada criminalista desde 1993 e professora universitária de Direito Penal desde 1998.

É diretora da Faculdade de Direito da UniSantos desde 2010, na qual também exerce a direção da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito – Mestrado e Doutorado. Coordenadora e Professora do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia da UniSantos.

Autora dos livros Direitos dos Presidiários e Suas Violações (Método, 2002) e Crimes Passionais ou Amor Patológico? (Paixão, 2009). Autora de artigos publicados em Revistas Jurídicas. Avaliadora do Conpedi – Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito.

 

Referências:

Jornal A Tribuna, A-9, 5 de julho de 2017.

MASSON, Cleber. Direito Penal – Parte Especial. Volume 2, 9ª edição, Editora Método: Rio de Janeiro, 2016.

NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal – Parte Especial. Volume 2, Editora Forense: Rio de Janeiro, 2017.

 

 

CATEGORIA:
Artigo
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