Cinco viram réus pela execução de cacique que denunciou CV em terra indígena
Por Eduardo Velozo Fuccia
Cinco homens viraram réus pela morte de um cacique que denunciou a atuação de um braço do Comando Vermelho (CV) no tráfico de drogas em terras indígenas no Sul da Bahia. Na decisão que recebeu a denúncia, o juiz Felipe Remonato, da Vara Criminal de Camacan, deferiu pedido do Ministério Público para decretar a prisão preventiva dos acusados, entre os quais o líder regional da facção, que autorizou a execução da vítima.
Os acusados foram denunciados por homicídio qualificado pelo motivo torpe e emprego de recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Por considerar que eles causaram danos morais coletivos, impactando na segurança pública, o MP requereu a fixação da quantia de R$ 200 mil como valor mínimo de reparação, a ser paga de forma solidária pelos réus, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal (CPP).
A inicial do MP tem 33 laudas e foi subscrita por sete promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco). Remonato observou que ela delineou a conduta de cada denunciado e preencheu os requisitos legais (artigos 41 e 395 do CPP), demonstrando justa causa para a deflagração da ação penal, porque há “fortes indícios acerca da autoria”.
Sobre o pedido de preventiva, o juiz avaliou que, diante da “gravidade acentuada” do delito, medidas cautelares diversas da prisão são insuficientes. O encarceramento, ao contrário, garante a ordem pública, é conveniente à instrução processual e assegura a aplicação da lei penal. “Seria incompreensível para a população, que pessoas acusadas de fato tão grave, voltassem normalmente ao convívio social sem terem sido julgadas”.
Cacique do Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe e coordenador Regional do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas do Estado da Bahia (Mupoiba), Lucas Santos Oliveira, de 31 anos, foi executado com 15 tiros durante emboscada em uma estrada vicinal do município de Pau Brasil, distante a cerca de 550 quilômetros de Salvador. O crime ocorreu no dia 21 de dezembro de 2023.
Mais conhecido por Lucas Kariri-Sapuyá, o líder indígena saiu da zona urbana da cidade e seguia de moto para a Aldeia Caramuru, onde haveria o Toré (tradicional ritual que envolve religião e dança). Porém, durante o percurso, o cacique foi abordado por dois homens em outra moto. Emerson Farias Fernandes conduzia o veículo, enquanto Amatiry Fernandes Santos ocupava a garupa e efetuou os disparos.
Com base nas investigações realizadas pela Coordenação de Conflitos Fundiários (CCF), da Polícia Civil, o Gaeco detalhou na denúncia que a ordem para matar o cacique partiu de Sandoval Barros dos Santos, líder em Pau Brasil da facção Raio A, que é braço do CV. Porém, para ordenar o assassinato, Sandoval precisou contar com aval de Fábio Santos Possidônio, chefe regional da organização criminosa.
Recolhido no sistema prisional há 17 anos, Possidônio autorizou a execução do interior do Conjunto Penal de Itabuna, conforme as investigações. O quinto denunciado é Michael Cardoso de Oliveira. De acordo com o Gaeco, ele instigou os integrantes da facção a cometerem o homicídio, informando que o cacique denunciou às autoridades o crime organizado e o narcotráfico no Território Caramuru Catarina Paraguaçu.
Segundo os promotores, a vítima atraiu para si “grande carga de ódio e desejo de vingança”. Além de o homicídio ser uma represália pelas denúncias contra a facção, o cacique aguçou a ira de Michael ao exonerar a mulher desse réu do cargo de diretora de uma escola estadual, porque a indicação dela se deu sem prévia submissão ao processo de avaliação comunitária, em ofensa às tradições indígenas locais.
Por diversas vezes, Lucas Kariri-Sapuyá se reuniu em órgãos e instituições dos governos Federal e do Estado da Bahia para denunciar o tráfico de drogas na terra indígena. Em razão disso, chegou a ser deflagrada uma operação policial, que resultou em prisões. O Gaeco constatou que os capturados tiveram acesso às informações do cacique às autoridades. Esse dado reforça que a facção orquestrou o homicídio em represália.
Foto da Aldeia Caramuru: Conafer
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