MP denuncia pastor pela morte de mulher trans por motivo fútil e asfixia
Por Eduardo Velozo Fuccia
Um homicídio motivado por uma discussão banal e cometido mediante asfixia. Desse modo, o promotor Fabio Perez Fernandez, que atua perante a Vara do Júri de Santos, no litoral de São Paulo, resumiu o assassinato de Luane Costa da Silva, mulher trans, e denunciou o acusado de cometê-lo: o engenheiro Antonio Lima dos Santos Neto, 45 anos, que disse em interrogatório à polícia também ser pastor de uma igreja.
O crime ocorreu na noite do último dia 22 no quarto nº 10 do Hotel Danúbio, situado na Rua Rangel Pestana, na Vila Mathias. O engenheiro chegou ao local de carro com a vítima às 20 horas, mas só ele se dirigiu a pé à recepção, onde pagou R$ 60,00 pelo período de uma hora. Em seguida, caminhou até a escada, onde Luane o aguardava, e ambos rumaram à suíte. Cerca de meia horas depois, Antonio saiu sozinho com o veículo.
A acusação formal do representante do Ministério Público (MP) foi oferecida na quarta-feira (31). Em sua inicial acusatória, o promotor narra que “o denunciado e a ofendida realizariam o programa sexual, momento em que o Antônio percebeu que a vítima era uma mulher transexual e, então, desistiu do encontro libidinoso. Ante a desistência do programa sexual, denunciado e vítima tiveram banal discussão”.
Por causa desse desentendimento, ainda conforme Perez, “Antônio apertou o pescoço de Luane até matá-la por asfixia”. Motivo fútil e asfixia são qualificadoras do homicídio, que o tornam crime hediondo e elevam a sua pena para 12 a 30 anos. Sem as qualificadoras, o homicídio seria considerado simples e punível com seis a 20 anos de reclusão, não recebendo o tratamento mais severo decorrente da hediondez.
Embora o laudo necroscópico da vítima ainda não tenha sido juntado aos autos, o que motivou o promotor a cobrar do Instituto Médico-Legal (IML) a remessa desse documento o mais rápido possível, declaração de óbito assinada pelo médico Fábio Chinen informa ser “asfixia por esganadura” a causa da morte. Com 27 anos de idade, Luane havia chegado recentemente a Santos, oriunda de Santo Antônio de Jesus (BA).
Como valor mínimo para reparação dos danos causados, Perez requereu que o acusado seja também condenado a pagar indenização de R$ 50 mil para os sucessores legais da vítima. O promotor ainda se manifestou pela manutenção da prisão preventiva do acusado sob as justificativas de que a medida é “proporcional, razoável e adequada” para a garantia da ordem pública e a conveniência da instrução criminal.
“Após o crime, o denunciado abandonou o cadáver no quarto e saiu do hotel como se nada tivesse acontecido. Pouco depois, deu-se conta de que havia esquecido seu telefone celular na cena do crime e retornou ao hotel para buscá-lo, ocasião em que foi detido pelos funcionários do estabelecimento”, detalha o representante do MP na denúncia, ao enfatizar a necessidade de o acusado permanecer preso.
Segundo Perez, embora seja homicídio cometido contra mulher, pouco importando se ela é cis ou trans, porque a proteção jurídica há de ser a mesma, não é o caso de se imputar ao acusado a qualificadora do feminicídio. “Não havia qualquer relacionamento familiar, doméstico ou de afeto entre eles, tampouco parece ter sido o crime motivado pelo menosprezo à condição de mulher, mas sim por fútil e banal discussão”.
Versão do acusado
Antonio foi autuado em flagrante e teve a prisão preventiva decretada no dia seguinte na audiência de custódia, sendo recolhido ao Centro de Detenção Provisória (CDP) de São Vicente. Ao ser interrogado na delegacia, alegou que, ao descobrir a condição de trans de Luane e desistir do programa, ela se sentiu humilhada e exigiu mais um Pix de R$ 100,00, caso contrário faria um escândalo e acionaria a polícia.
De acordo com o engenheiro, ele ficou receoso por ser casado e pastor de igreja. Ao tentar ir embora e ser impedido pela vítima, que reteve a chave do quarto, entrou em luta corporal com ela até conseguir sair da suíte. Antonio disse que Luane investiu contra ele com uma máquina de choque, mas esse objeto não foi achado, porque o acusado afirmou que o levou consigo e o dispensou na fuga. Casado há 24 anos, ele tem três filhos.
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