MPF denuncia Ultracargo por crimes ambientais decorrentes de megaincêndio
Por Eduardo Velozo Fuccia
O Ministério Público Federal (MPF) ofereceu denúncia contra o Terminal Químico de Aratu (Tequimar), do Grupo Ultracargo, em razão de supostos crimes ambientais decorrentes do incêndio de grandes proporções na base da empresa situada na Alemoa, em Santos, entre os dias 2 e 10 de abril de 2015.
Com 12 laudas, a acusação formal do MPF foi elaborada pelos procuradores da República Antonio José Donizetti Molina Daloia e Juliana Mendes Daun Fonseca, em 15 de fevereiro. O juiz federal Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal de Santos, recebeu a denúncia dia 20 e determinou a citação do Tequimar para apresentar resposta escrita à acusação no prazo de dez dias.
O incêndio na empresa Ultracargo durou mais de 197 horas, sendo considerado o maior em região industrial do País e o segundo maior do gênero da história mundial, em volume de pessoal empregado. Foram mobilizados 118 homens para o combate às chamas no episódio de Santos. Em 2005, na Inglaterra, atuaram 180 bombeiros.
Consta da denúncia que, segundo laudo pericial criminal, os efluentes de combate ao incêndio provocaram a mortandade de mais de nove toneladas de peixes, destruição significativa da flora em razão do calor irradiado pelo incêndio, impacto à vegetação, poluentes atmosféricos, além de serem identificadas 142 espécies de peixes afetadas, dentre essas, 15 sob o risco de ameaça.
Conforme outro laudo, produzido pelo Centro de Apoio Operacional à Execução (Caex), do Ministério Público de São Paulo (MPSP), o incêndio teve como causa o fenômeno conhecido por Boiling Liquid Expanding Vapor Explosion (Explosão de Vapor em Expansão de Líquido em Ebulição) na bomba nº 2678.
A liberação de combustível em autoignição ocasionou a ruptura da carcaça desta bomba, cujas válvulas estavam fechadas, quando deveriam se encontrar abertas, “caracterizando falha operacional da empresa”, assinalam os procuradores da República. “Insta salientar que a empresa tem o dever de conhecer os riscos dos produtos que armazena, manipula e transborda”.
Os produtos mencionados pelos representantes do MPF são álcool, gasolina e diesel, todos altamente inflamáveis. A denúncia ainda frisa que, além da falha operacional, a empresa Ultracargo não “adotou as providências necessárias para o combate imediato do incêndio”, contribuindo para que o fogo se “alastrasse descontroladamente”.
“A ineficácia dos sistemas de proteção, em especial, o dedicado ao resfriamento, possibilitou o aumento sensível da temperatura das paredes e solda do tanque, atingindo valores que acarretaram as avarias estruturais, com sua ruptura e colapso, vaporizando de forma explosiva o seu conteúdo, dando prosseguimento à propagação do fogo e atingindo o tanque adjacente”, prossegue a denúncia.
O laudo do Caex informa que seis tanques foram atingidos diretamente pelo sinistro, enquanto outros dois tiveram as chamas limitadas às suas tubulações. Cerca de 33 mil m³ de gasolina e álcool anidro estavam armazenados nos compartimentos afetados pelo fogo e os sistemas de combate a incêndio da empresa revelaram-se ineficientes.
A denúncia destaca, por fim, a falta de adoção de medidas eficazes para impedir a chegada dos efluentes ao estuário. “As barreiras de contenção colocadas não foram suficientes”. Para os procuradores da República, o Grupo Ultracargo agiu com dolo eventual, porque, “prevendo os riscos de operar a empresa mesmo diante de tais falhas, assumiu os riscos de causar poluição e os impactos ambientais ocorridos”.
De acordo com o MPF, os danos não se resumiram à fauna e à flora, havendo também prejuízo à saúde pública, à segurança, ao uso e gozo da propriedade, bem como, ao desenvolvimento das atividades normais da comunidade, próxima e distante do local do sinistro.
“As ações/omissões da empresa superaram a mera culpa, evidenciando que agiu com dolo eventual”, concluem Antonio Daloia e Juliana Fonseca. Eles pleiteiam a condenação do Tequimar a penas restritivas de direito, de prestação de serviços comunitários e de multa, previstas na Lei 9.605/1998, “em patamares compatíveis com a gravidade dos danos causados e suficientes para assegurar a efetividade da ação penal”.
As penas restritivas de direitos aplicáveis às pessoas jurídicas são: suspensão parcial ou total de atividades; interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade, e proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.
Em relação à prestação de serviços à comunidade, as pessoas jurídicas condenadas por crimes contra o meio ambiente estão sujeitas às seguintes sanções: custeio de programas e de projetos ambientais; execução de obras de recuperação de áreas degradadas; manutenção de espaços públicos, e contribuição a entidades ambientais ou culturais públicas.