TJ-SP dobra indenização a pais de jovem morto por seguranças de casa noturna
Por Eduardo Velozo Fuccia
“A perda de um filho acarreta aos pais do falecido um sentimento de dor interminável”. A frase é do desembargador Donegá Morandini, da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), e resume a justificativa de seu voto, seguido por unanimidade, para aumentar de R$ 200 mil para R$ 400 mil a indenização por dano moral a ser paga solidariamente por uma casa noturna e o seu proprietário.
Os autores da ação cível são os pais de Lucas Martins de Paula, de 21 anos, quartanista de Engenharia Elétrica. O jovem contestou o lançamento de uma cerveja no valor de R$ 15,00 em sua comanda e, por esse motivo, seguranças da casa noturna o agrediram. O crime ocorreu na madrugada de 7 de julho de 2018, em Santos, e a vítima faleceu após ficar 22 dias internada na Unidade de Terapia Intensiva da Santa Casa do município.
A juíza Lívia Maria de Oliveira Costa, da 8ª Vara Cível de Santos, julgou a ação procedente para condenar a casa noturna e o seu dono a ressarcir os pais do universitário em R$ 5.169,50, referente às despesas funerárias. Aos réus também foi determinado o pagamento de pensão mensal de um salário mínimo e de meio salário mínimo, respectivamente, para a mãe e o pai da vítima até que completem 75 anos de idade.
Em relação aos danos morais, a magistrada fixou a indenização em R$ 100 mil para cada autor, motivando-os a recorrer para elevar essa quantia. Relator da apelação, Morandini assinalou que o arbitramento feito na sentença não atendeu às diretrizes traçadas pelo artigo 944 do Código Civil, que diz: “a indenização mede-se pela extensão do dano”. Os desembargadores João Pazine Neto e Viviani Nicolau tiveram o mesmo entendimento.
Segundo o colegiado, o episódio narrado nos autos sempre será lembrado com tristeza pelos apelantes e lhes causará angústia. “A intensidade e a duração do sofrimento não podem deixar de ser considerados por ocasião da fixação da indenização, merecendo o devido sopesamento”. Além disso, a majoração pleiteada também é justificada pelas circunstâncias em que a morte ocorreu.
Conforme o acórdão, a agressão cometida pelos seguranças, que deveriam garantir a integridade física dos clientes, elevou o grau de reprovabilidade da sua ação. “A resposta ao dano causado pelos apelados, diante das mencionadas circunstâncias, há de ser mais robusta, compensando os apelantes pelo dano experimentado e, ao mesmo tempo, punindo os seus causadores de maneira suficiente para que não reincidam na conduta”.
De acordo com a sentença, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código Civil, uma vez reconhecida a responsabilidade dos seguranças pela morte da vítima, a casa noturna Baccará Backstage e o seu proprietário, Vitor Alves Karam, são responsáveis pela reparação civil decorrente da conduta dolosa de seus prepostos, principalmente porque o dono estava presente durante a violenta agressão e nada fez para impedi-la.
O advogado Armando de Mattos Júnior representa os pais do universitário. Ele disse que “não há dinheiro no mundo que traga de volta o Lucas, mas a 3ª Câmara de Direito Privado entendeu a necessidade de se elevar o valor para mitigar o sofrimento pela sua precoce e brutal morte”. Mattos também atuou como assistente da acusação na ação penal que resultou na condenação no júri de dois seguranças e do dono da casa noturna.
Júri popular
No âmbito penal, o Ministério Público denunciou dois seguranças, o chefe da segurança e o dono da casa noturna por homicídio qualificado pelo motivo fútil, meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Conforme o laudo necroscópico, Lucas morreu em razão de múltiplas lesões na cabeça, que lhe causaram traumatismo cranioencefálico e hemorragia intracraniana.
Com exceção do chefe da segurança, que faleceu durante a ação penal, os demais réus foram submetidos a júri e condenados. O segurança Thiago Ozarias Souza recebeu a maior pena: 18 anos de reclusão. Instrutor de jiu-jitsu, ele foi acusado de desferir uma sequência de socos e chutes no estudante. Responsável pelo ‘golpe de misericórdia’ na vítima, o outro segurança, Sammy Barreto Callender, foi sentenciado a 16 anos.
O empresário Vitor Alves Karam, dono do estabelecimento, também foi condenado a 16 anos. Na decisão de pronúncia, o juiz Alexandre Betini, da Vara do Júri de Santos, destacou que esse réu e o chefe da segurança não impediram a violência, embora bastasse uma ordem deles aos demais acusados para a agressão ser interrompida. Segundo o julgador, essa omissão ficou evidenciada pelas imagens de câmeras de segurança.
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