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08/07/2023

Doleiro é condenado por associação para o tráfico internacional em Santos

Por Eduardo Velozo Fuccia

Para evitar dupla responsabilização penal sobre o mesmo fato, o delito autônomo de financiar ou custear o tráfico de drogas (artigo 36 da Lei 11.343/2006) não é cabível a quem faz parte de associação voltada ao narcotráfico, porque, nesta hipótese, deve ser aplicada a causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso VII, da legislação especial.

Com essa fundamentação, o juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, titular da 5ª Vara Federal de Santos (SP), julgou parcialmente procedente a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra um homem apontado como “doleiro” do Primeiro Comando da Capital e o condenou apenas pelo delito de associação para o tráfico (artigo 35 da Lei de Drogas).

O julgador aplicou as causas de aumento de pena, de um sexto a dois terços, referentes à transnacionalidade do delito e ao fato de o agente custear ou financiar a prática do crime. Elas estão previstas, respectivamente, nos incisos I e VII do artigo 40, sendo a sanção total do réu fixada em oito anos e quatro meses de reclusão, em regime inicial fechado.

Com o reconhecimento da causa de aumento de pena do inciso VII, o juiz absolveu o acusado do crime do artigo 36, por entender que ele praticou condutas relacionadas ao crime de associação para o tráfico de drogas em conjunto com atos relacionados ao financiamento e custeio do crime de tráfico.

“É importante observar que essas disposições legais não podem ser empregadas de maneira cumulativa, uma vez que tal interpretação conduziria à sobreposição de sanções pela prática do mesmo fato. Tal posicionamento busca conferir coesão ao ordenamento jurídico, evitando a incidência do bis in idem”, justificou Lemos.

Segundo o magistrado, mensagens telefônicas interceptadas com autorização judicial revelou que o réu possuía “relevante papel na organização criminosa, participando ativamente de seu núcleo financeiro”. Tais provas, ainda conforme o julgador, demonstraram a conexão do acusado com integrantes do alto escalão do tráfico internacional de drogas.

O grupo do qual o réu é acusado de pertencer foi desmantelado pela Polícia Federal durante a Operação Oversea, que resultou no ajuizamento de várias ações penais. Os criminosos seriam responsáveis por enviar cocaína ao exterior em navios que zarparam do Porto de Santos. A denúncia delimitou a atuação do doleiro ao período de janeiro de 2013 a março de 2014.

A sentença concluiu que o doleiro Ahmad Ali Ali, o Babá, não se limitava a realizar o câmbio de moedas, como real, dólar e euro. Ele também disponibilizava créditos e facilitava o fluxo de recursos, tornando-se “peça-chave no sustento econômico das atividades criminosas, possibilitando a continuidade do tráfico internacional de drogas”.

O doleiro nega envolvimento com o esquema criminoso, mas o conjunto probatório convenceu o juiz de que ele “detinha pleno conhecimento das atividades empreendidas por seus ‘clientes’, agindo em correspondência com tais práticas ilícitas”. Inclusive, o réu estabeleceu para si uma remuneração de 10%, bem superior à praticada pelas casas de câmbio nas operações legais.

Para o julgador, esse percentual de “comissão” indica que o réu não só tinha consciência da ilicitude dos negócios, ao estabelecer percentual compatível ao risco inerente à natureza ilícita das transações, como também demonstra a sua “disposição em lucrar com a demanda de serviços relacionados ao tráfico internacional de drogas”.

Histórico negativo

Ahmad Ali Ali foi condenado pela 13ª Vara Federal de Curitiba (PR) a nove anos, dez meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, por integrar organização criminosa e lavagem de dinheiro. Ele recorreu ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que negou provimento à apelação. Atualmente, há recurso especial pendente de julgamento no Superior Tribunal de Justiça.

Na fixação da pena-base acima do mínimo legal e na definição do percentual aplicado nas causas de aumento de pena do artigo 40, Lemos considerou o “histórico criminal do réu marcado pela sua atuação como empresário do crime, integrando e financiando múltiplas organizações criminosas voltadas ao tráfico internacional de drogas”.

Esse mesmo fato, além de o acusado ter renda mensal de R$ 160 mil a R$ 170 mil, conforme ele próprio informou em seu interrogatório judicial, motivou o julgador a também condená-lo ao pagamento de 1.943 dias-multa, cada um no valor dois salários mínimos vigentes à época dos fatos, com atualização monetária até o efetivo pagamento.

A sentença assinala que diante da “significativa capacidade econômica” do réu, esse montante de multa é necessário para impactar de forma proporcional a sua esfera financeira e desencorajar a reiteração de condutas delituosas. Quanto à pena corporal, devido à falta de pedido de prisão preventiva por parte do MPF, o juiz possibilitou ao acusado o direito de recorrer em liberdade.

Imagem: Pixabay

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