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04/09/2017

A infiltração cibernética nos crimes sexuais contra a criança e o adolescente

Especialista em Ciências Penais e Criminologia, Grecco Lisboa analisa a Lei 13.441/17, que propicia novos meios de investigação para reprimir com maior eficácia crimes cometidos por meio da internet

Por Leopoldo Grecco Lisboa (*)

A evolução dos meios de comunicação nas últimas décadas implicou na transcendência das informações, permitindo que todas as áreas do conhecimento humano estivessem acessíveis a qualquer um que se arrisque a navegar pelo espaço cibernético.

A preocupação do legislador então se volta ao crescente uso nocivo de redes sociais e sites voltados à pornografia infantil ou comportamentos ilícitos que contrastam com valores morais.

Assim, em torno da proteção da criança e do adolescente, as mudanças foram mais significativas, visando coibir a prática da exploração sexual de menores, visto a sua condição peculiar de pessoa humana em desenvolvimento.

Destarte, houve a necessidade de não somente prever condutas ilícitas, mas de obter meios de alcançar os seus autores, que se valem do anonimato dos sites para perpetrar as suas práticas abjetas e repulsivas.

Nesse sentido, obedecendo a uma diretriz de política criminal internacional, um avanço salutar foi a publicação da Lei 13.441/2017, de 8 de maio de 2017, que alterou o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).

A recente legislação prevê a possibilidade de infiltração de agentes policiais na internet, visando apurar infrações penais que afrontem a dignidade sexual da criança e do adolescente.

O instituto da infiltração não é novo na legislação pátria e possui grande valia como meio persecutório de práticas delitivas, já corriqueiro nas atividades policiais habituais, importante na formação de elementos probatórios.

Não obstante as classificações possíveis em matéria de infiltração, notamos que a trazida pela lei supra inova por não preencher os requisitos que doutrinariamente se exigem nas modalidades simples e complexas.

Não pode ser classificada na primeira, pois nem sempre a vítima terá conhecimento de que está sendo monitorada. Tão pouco se adequa à complexa, visto que a intervenção policial é realizada por monitoramentos de dados de conexão e dados cadastrais, conforme o Artigo 10, § 2º, incisos I e II, da lei em comento.

Logo, tem-se nova forma de infiltração, ao qual denominamos por gerencial, visto que a investigação decorre primeiramente através de monitoramento dos sistemas cibernéticos, averiguando situações sobre crimes contra a dignidade sexual de criança e do adolescente por meio da internet. Isso viabiliza ao agente policial, após autorização judicial, infiltrar-se para a efetiva obtenção de provas contra seu autor.

A lei depreende no Artigo 10, § único, que, durante toda a infiltração, se tenha um cuidado específico para “garantir o sigilo das investigações” no curso da atividade. Para tanto, o acesso aos autos e às informações colhidas deverá ficar restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia.

Todavia, para que se proceda à infiltração nos casos de crimes sexuais envolvendo crianças e adolescente pela internet, a lei exige como requisitos, de acordo com os incisos I e II do Artigo 10 da Lei 13.441/17:

 

a) uma investigação já em curso, com instauração de inquérito policial;

b) requerimento do Ministério Público ou representação do delegado de polícia, contendo a necessidade da medida, o alcance das tarefas policiais, os nomes ou apelidos dos investigados e os dados de conexão ou cadastrais que permitam a identificação das pessoas;

c) autorização judicial circunstanciada e fundamentada, estabelecendo os limites da medida;

d) oitiva do Ministério Público, exceto quando, óbvio, for ele o requisitante.

 

Questão aventada é quanto à violação de direitos pelo agente policial que se vale de identidade falsa ou oculta a real identidade para fins de captar informações no meio cibernético. Estaria ele incorrendo na tipificação de falsa identidade do Artigo 307 do Código Penal?

A resposta parece negativa à luz do Artigo 190-C da lei em tela, visto que não comete crime o policial que oculta sua identidade para, por meio da internet, colher indícios de autoria e materialidade nos crimes dessa natureza. Logo, não se trata de mera excludente de culpabilidade. Posto que a lei anota que não há crime, a própria ilicitude da conduta resta esvaziada.

 

(*) Bacharel em Direito pela Universidade Santa Cecília (Unisanta). Investigador de Polícia da Central de Inteligência Policial do Departamento de Polícia Judiciária do Interior-6 (Deinter-6). Pós-graduado em Ciências Penais e Criminologia, Política Criminal e Segurança Pública pela Uniderp/Anhanguera. Autor dos livros Vítima, esse ser desconhecido e Direito Penal do Inimigo na visão supraconstitucional.

 

 

CATEGORIA:
Artigo
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