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27/06/2023

TJ-SP revoga prisão preventiva baseada em “argumento circular”

Por Eduardo Velozo Fuccia

Em razão do “argumento circular” que fundamentou a decretação da prisão preventiva de um acusado de roubar uma correntinha de ouro em Guarujá, a 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu habeas corpus para revogar a custódia cautelar, expedindo o alvará de soltura do réu.

Conforme o acórdão, sob a relatoria do desembargador Alberto Anderson Filho, o despacho que converteu a prisão em flagrante em preventiva não especifica os motivos concretos que determinaram a manutenção da custódia cautelar. “A rigor, a fundamentação pode ser utilizada em praticamente todos os casos de roubo”.

Embora a decisão do colegiado tenha sido unânime, inicialmente, o relator votou pela manutenção da prisão. Segundo ele, as questões trazidas na sustentação oral do advogado Tércio Neves Almeida exigiriam apreciar o mérito, o que é incabível pela via do habeas corpus, devendo ser analisadas pelo juiz da causa, no curso da ação.

Porém, o relator reavaliou o seu posicionamento, alterando o seu voto para conceder o habeas corpus, após a manifestação do segundo julgador, o desembargador Figueiredo Gonçalves. Este apontou a falta de indicação de uma atividade concreta sequer, própria do crime sob análise nos autos, na decisão que decretou a preventiva.

“Dá (o juízo de primeiro grau) voltas e voltas sempre ao mesmo argumento. É o que a gente chama de argumento circular, isto é, roubo é crime grave, roubo é crime de alta periculosidade, portanto, se está imputando delito de roubo, ele (o réu) merece a prisão preventiva”, afirmou Gonçalves.

O advogado Tércio Neves Almeida sustentou oralmente as razões do seu habeas corpus

Em seu pedido de revogação da prisão por ausência de justificativa concreta, o advogado disse que o fundamento da garantia de ordem pública tem um “conceito vago, porque ninguém sabe ao certo o que significa”, servindo para embasar a preventiva de qualquer pessoa, inclusive, primária e de bons antecedentes, como seria o caso do seu cliente.

Almeida também sustentou que o acusado, “pessoa pobre”, caminhava em direção à praia e foi injustamente acusado de praticar um roubo. Em seguida, com base em um reconhecimento que não obedeceu às formalidades legais, porque não foi perfilado ao lado de outras pessoas com características semelhantes, o réu foi autuado em flagrante.

Gonçalves também citou o aspecto social para afastar o argumento de que o réu não teria ocupação lícita. O desembargador discorreu que cerca de 10 milhões de pessoas estão desempregadas no País e, segundo dados do IBGE, há mais 3 milhões de “desalentados”, que já não procuram mais emprego porque sabem que não os encontram.

“Então, encontrar alguém nessas condições é indicativo de prática criminosa?”, questionou Gonçalves. Por fim, o julgador criticou o uso de “recorte-cola” para repetir o “chavão” da periculosidade da ação e da gravidade do crime na decretação de preventivas, sem a indicação de fatos concretos.

 O desembargador Mário Devienne Ferraz seguiu os colegas de câmara, destacando que a decretação da prisão foi “capenga de fundamentação”. Segundo o acórdão, não foram arroladas testemunhas que eventualmente poderiam ser influenciadas pelo réu solto, bem como a vítima é policial civil, que dificilmente poderá ser intimidada pelo acusado.

O policial estava de folga quando foi assaltado na avenida da orla da Praia das Pitangueiras, no dia 1º de maio, supostamente por quatro homens, um dos quais armado. O grupo fugiu correndo, sendo apenas o acusado preso pela própria vítima. A correntinha de ouro roubada não foi recuperada. A arma usada no delito não foi apreendida.

De acordo com a decisão que decretou a preventiva na audiência de custódia, além da gravidade abstrata do delito, vislumbra-se a presença dos requisitos da prisão, “sendo incabível conceder ao indiciado o benefício da liberdade provisória, cumulada com a fixação de medidas cautelares, pois inadequadas e insuficientes para o caso concreto”.

Posteriormente, a defesa do réu requereu a sua liberdade provisória, mas o juízo da 1ª Vara Criminal de Guarujá negou o pedido: “O réu apresenta periculosidade real que coloca em risco a ordem pública, sendo que sua custódia cautelar é a única forma de se garantir a ordem pública, pois em liberdade poderá tornar a praticar condutas ilícitas”.

Imagem: Pixabay

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